Por Davidson Magalhães*
A pandemia do coronavírus, além de uma mortandade jamais vista, provocou uma parada brusca e simultânea na economia mundial, o que resultou em um choque na oferta e procura de bens e serviços, interrompendo importantes fluxos nas cadeias produtivas e entre as nações. Um estrago letal na atividade econômica, queda nos PIBs e desemprego em massa.
Quando a pandemia chegou ao Brasil, já o encontrou com uma economia em estado de letargia. Vamos aos números. O PIB, em 2019, cresceu apenas 1,1% frente a 2018, e de 2015 a 2018 já acumulava uma retração de -4,6%. Outros indicadores apontam também a ineficiência do “Posto Ypiranga” e sua política ultraliberal. A taxa de investimentode 2,2% em 2019, além de irrisória, é inferior à de 2018 (3,9%).
A indústria brasileira fechou 2019 com uma queda de 1,1%, o segundo pior resultado desde 2016. Em 2000, as vendas de manufaturados correspondiam 59% do valor exportado; em 2019, caiu para 35%, a menor desde 2000. As contas externas encerram 2019 com um déficit de US$ 50,7 bilhões, um aumento de 22% em relação a 2018.
Antes da pandemia, os indicadores sociais já apontavam um sério agravamento. O mercado de trabalho cada vez mais precário, resultante das reformas trabalhistas e do fim da política de valorização do salário mínimo, já somava 11 milhões de desempregados, 26 milhões de subutilizados e 41 milhões na informalidade, com salários estagnados. O Brasil terminou 2018 com 13,5 milhões de brasileiros em condições de extrema pobreza.
O PIOR VÍRUS VEM DO PLANALTO
Além de encontrar a economia debilitada e uma crise social em gestação, a pandemia deu de cara com um forte aliado à sua expansão, o governo Bolsonaro. Ele subestimou o coronavírus tratando-o como uma “gripezinha”. Esta atitude negacionista materializou-se no combate que o presidente faz ao isolamento social, única forma adotada por autoridades sanitárias mundiais, para controlar a expansão do vírus. À falta de comando na saúde, dois ministros foram demitidos e ainda estamos com um interino militar sem a menor noção de saúde pública, soma-se a inapetência da área econômica para lidar com os efeitos da moléstia na economia.
A timidez e a demora na adoção de medidas econômicas agravaram o quadro grave imposto pela pandemia. Enquanto nos países atingidos implantou-se de maneira ágil e ampla, medidas para garantir o emprego, a renda e o socorro às empresas, o ministro Guedes queria implantar “reformas” para atrair investidores, situação surreal neste momento de crise.
O governo propôs apenas R$200,00 de auxílio emergencial, o que foi alterado pelo Congresso Nacional, passando para R$600,00, e que pode chegar a R$1.200,00. A distribuição têm sido caótica, com filhas humilhantes nas esquinas das cidades, sem falar nos seguidos adiamentos de liberação das parcelas e postergação da análise dos cadastrados.
A ajuda às empresas – medidas de crédito para capital de giro e financiamento da folha de pagamento – não chegou na ponta pois esbarrou na lentidão do Ministério da Economia e do Banco Central, nas burocracias e exigências de garantias absurdas do setor financeiro. O que resultou até maio em menos de vinte por cento de utilização dos recursos previstos.
BOLSONARO APOSTA NO CAOS
A pandemia continua a colecionar cadáveres e fazer estragos na economia e na vida das pessoas. Bolsonaro preocupado em defender os seus milicianos das fakes news, e proteger os filhos 01, 02 e 03, acusados e investigados por vários crimes- “rachadinhas”, lavagem de dinheiro e envolvimento com milícias-, atenta contra as instituições, cria instabilidade e gera mais incertezas no setor econômico.
A ajuda financeira do governo federal aos estados e municípios (R$ 60,15 bilhões), foi sancionada muito depois (29/05) da chegada da pandemia. Bolsonaro e Guedes também vetaram a suspensão do pagamento da dívida dos estados, quase zerados em arrecadação e com gastos enormes e não previstos no combate à COVID-19. Este comportamento do governo prejudica diretamente os entes federados, que são de fato, os executores das políticas públicas de combate ao coronavírus.
Ao encontrar o terreno adubado pela irresponsabilidade e incompetência, a pandemia do covid-19 atingiu em cheio a economia. O primeiro trimestre de 2020 encolheu 1,5% em relação ao último trimestre de 2019, segundo o IBGE, números apenas da primeira quinzena do isolamento social. Os próximos números, serão piores ainda. O consumo das famílias, responsável dois terços do PIB, caiu 2% neste período.
De fevereiro a abril, 4,9 milhões de vagas foram fechadas, sendo 3,7 milhões do mercado informal. Só em abril registrou-se um saldo negativo de 860.503 empregos formais com carteira assinada (Caged). Os investimentos estrangeiros foram em abril, o menor valor em 25 anos, US$ 234 milhões, uma queda de 95% em relação aos ingressos líquidos de 2019 (Banco Central).
O REMÉDIO É MUDANÇA NA ECONOMIA
O enfrentamento às consequências econômicas da pandemia exige um programa de intervenção que combine a garantia de emprego, renda e socorro às empresas, estados e municípios e um plano de retomada pós-pandemia. É fundamental, para a queda em depressão, a superação do dogma neoliberal, aliás, já posto de lado por grandes economias. E também a imediata emissão de moeda, que não amplia a dívida pública, pois nenhum país quebra por endividamento em moeda nacional.
Nas ações imediatas, elenco as seguintes iniciativas: a extensão do auxílio emergencial até dezembro, e ampliação das parcelas do seguro-desemprego pelo mesmo período. Os recursos devem ser liberados diretamente às empresas pequenas e médias, em condições especiais e com garantia do tesouro, condicionados à manutenção do emprego.
Temos de implementar uma política de segurança alimentar, com superação dos entraves e limitação do socorro a estados e municípios. É necessário um reforço orçamentário no SUS, suspensão do pagamento do Crédito Educativo do Fies, e das prestações do Minha Casa Minha Vida, para desempregados.
O pós-pandemia nos reserva incertezas e instabilidades. Quadro econômico recessivo, possível recrudescimento do nacionalismo, barreiras e restrições ao fluxo de bens e serviços, acirramento da disputa geopolítica entre EUA X China, agravamento da crise social e ambiental.
Precisamos de um programa de retomada econômica que considere este contexto global, e implemente um novo projeto de desenvolvimento, com protagonismo dos investimentos públicos em infraestrutura e habitação.
De imediato, definir uma política industrial, que inclua a reconversão de setores com a retomada de produção de insumos e produtos estratégicos, cuja produção migrou para outros países, tais como os insumos farmacêuticos ativos (IFAs), usados na fabricação local de remédios e a produção de fertilizantes. É preciso também o fortalecer nossas indústrias da construção civil pesada, naval, máquinas, cadeia de petróleo/gás e aviação (Embraer).
A estas medidas focadas na retomada da indústria, devem se incorporar ações urgentes no campo educacional, ciência e tecnologia, desenvolvimento regional, valorização do trabalho e combate às desigualdades.
O pós-pandemia depende de como vamos superar os dois vírus que nos atormentam e tem uma enorme capacidade de destruição: coronavírus e bolsovírus. Vamos à luta!
*Davidson Magalhães é secretário do Trabalho,
Emprego, Renda e Esporte da Bahia e presidente do
PCdoB-Bahia