O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pretende intensificar a costura da rede de proteção que vem articulando no Legislativo para se blindar de um eventual processo de impeachment caso os desdobramentos da prisão do policial militar aposentado Fabrício Queiroz agravem a atual crise política.
Na quinta (18), mesmo dia em que o ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) foi detido, o presidente promoveu um almoço com deputados e disse que pretende fazer reuniões frequentes com parlamentares.
Em outra frente, auxiliares palacianos dizem que o presidente sinalizou que novos indicados do centrão devem ser nomeados para cargos de segundo e terceiro escalões nos próximos dias, na tentativa de assegurar o apoio das siglas que compõem o grupo em um momento de fragilidade do governo.
Por ora, líderes do centrão buscam minimizar a prisão do ex-assessor de Flávio, mas sabem que a situação política pode se agravar diante de novos desdobramentos do caso.
Queiroz foi preso em um imóvel em Atibaia (SP) pertencente ao advogado Frederick Wassef, responsável pelas defesas de Flávio e de Bolsonaro. O mandado de prisão foi expedido pela Justiça do Rio.
Segundo pessoas próximas à família do presidente, há um temor de que Queiroz seja pressionado a ponto de aceitar uma delação premiada.
Além de o policial reformado ter sido preso preventivamente, há mandado de prisão contra a mulher dele, Márcia Aguiar, que foi assessora de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Integrantes do núcleo jurídico estão especialmente preocupados com a possibilidade de Márcia e a filha do casal Nathália Queiroz também serem pressionadas a delatar.
Auxiliares agem ainda para descolar o presidente da figura de Wassef, que atua na defesa da família e é considerado próximo de Bolsonaro desde 2014, pelo menos.
Ministros têm aconselhado Bolsonaro a evitar falar de Queiroz e seus problemas no Judiciário publicamente. Integrantes da ala militar dizem que o presidente precisa parar de estimular pautas negativas e impulsionar as ações do governo.
Bolsonaro e equipe não sabem o que virá pela frente e por isso ainda não definiram como o presidente se comportará. Por outro lado, ele já vem trabalhando para tentar pacificar sua relação com o STF (Supremo Tribunal Federal) e para construir uma base sólida no Congresso para garantir-lhe os 172 votos necessários para frear um eventual processo de impeachment.
Na quinta, mesmo visivelmente desgastado pela semana crítica que protagonizou, o presidente manteve almoço que havia combinado no dia anterior com o deputado federal Fábio Ramalho (MDB-MG), durante a posse do novo ministro das Comunicações, Fábio Faria.
Ramalho tem perfil agregador e costuma construir pontes em almoços e jantares que reúnem congressistas de diversas legendas. O almoço da semana passada levou ao Palácio do Planalto dez deputados de partidos como MDB, PP, PL e PSL.
“Ele [Bolsonaro] disse: ‘Vou fazer mais uns almoços aqui’. Tem que ter diálogo constante. Tem que conversar com todo mundo mesmo”, disse Ramalho à reportagem. De acordo com o deputado, o próximo almoço deverá acontecer no mês que vem.
Com o possível agravamento da crise, assessores do presidente preveem que o centrão, grupo que vem negociando cargos em troca da promessa de apoio, irá aumentar o valor de seu passe e pedir mais postos –e de maior relevância, não apenas os de segundo e terceiro escalões.
Líderes do centrão negam que tenham feitos pedidos para recriar ministérios ou mesmo que queiram ocupar a titularidade de alguma pasta.
Apesar da ofensiva do presidente, dentro do próprio centrão há dúvidas sobre até que ponto o bloco partidário poderia apoiar Bolsonaro caso a crise se agrave.
Um congressista lembrou, por exemplo, que nenhum líder do centrão defendeu o presidente publicamente após a prisão de Queiroz.
O mesmo líder ressalta que, assim como aconteceu com a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), se a situação de Bolsonaro se agravar muito, não adianta dar cargos e liberar emendas. Ao final, todos acabam abandonando o governo.
O capítulo Queiroz foi apenas o último de uma das piores semanas que Bolsonaro enfrentou em seu um ano e meio de governo.
Quando não escondeu o mau humor com apoiadores ao deixar o Palácio da Alvorada na segunda (15), Bolsonaro começava a lista de problemas que teria pela frente.
Naquele momento, sabia que teria de estender uma bandeira branca ao STF depois que seus apoiadores lançaram fogos de artifício contra o prédio da corte e que seu então ministro da Educação, Abraham Weintraub, reiterou publicamente xingamento aos magistrados. Encerrou a semana entregando a cabeça de Weintraub como sinal de paz.
Bolsonaro também sabia que uma de suas apoiadoras com mais projeção, Sara Giromini, conhecida como Sara Winter, havia sido presa naquela manhã. Foi denunciada pela Procuradoria da República no Distrito Federal sob acusação de injúria e ameaça contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo.
O presidente mandou que os seguranças levassem seus apoiadores para a área interna do Alvorada. Para não se indispor, queria ficar longe da imprensa. Não adiantou.
“Minha senhora, se eu for tratar assunto individualmente do Brasil todo, eu vou ser prefeito, não presidente da República”, disse a uma mulher que pedia uma agenda com o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho.
“Eu não posso ser um agenciador de agenda. Um funcionário para achar agenda para todo mundo. Por favor, procure o Ministério da Saúde”, respondeu a um outro apoiador.
Mas sabia o presidente que sua maré de azar estava apenas começando.
Na terça-feira (16), o juiz que acompanha o caso da facada sofrida por ele em 2018 determinou o arquivamento do inquérito da Polícia Federal que concluiu que Adélio Bispo agiu sozinho, esvaziando o discurso que Bolsonaro tenta manter desde a data do atentado.
Neste mesmo dia, o presidente já havia amanhecido com seus apoiadores sendo visitados por agentes da PF com mandados de busca e apreensão em mãos, no âmbito do inquérito que apura a produção de fake news.
Ao voltar para casa, no fim do dia, mais más notícias: 11 parlamentares de sua tropa de choque foram alvo de quebra de sigilo bancário. Tudo a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República) e autorizado por Moraes.
Na quarta-feira (17), Bolsonaro lançou no ar uma frase com tom de ameaça após a ação autorizada pela corte. Disse que houve abuso na operação e afirmou que “está chegando a hora de tudo ser colocado no devido lugar”.
O tom mais pacificador veio de Fábio Faria, que tomou posse naquele dia pedindo um “armistício patriótico”.
Mal sabia que a posse ainda lhe traria dor de cabeça. Não pelo ministro, cuja chegada trouxe de volta o centrão para os salões do Planalto. Mas pela presença do advogado Frederick Wassef na ocasião.
Afinal foi em uma casa de Wassef, que, na manhã de quinta-feira, a polícia encontrou e prendeu Queiroz.
Bolsonaro ficou acuado. Evitou até seus apoiadores e fez sua live semanal naquele dia acompanhado apenas da intérprete de libras. Com semblante abatido, tentou se distanciar da nova crise.
Folhapress