Nutrição de precisão alia produção e sustentabilidade na pecuária leiteira

A nutrição de precisão ganha força no Brasil como aliada dos produtores de leite no desenvolvimento de uma pecuária ambientalmente eficiente. Estudo desenvolvido pela Embrapa Pecuária Sudeste (SP) comprovou que o equilíbrio entre nutrientes na alimentação de vacas em período de lactação é capaz de garantir ganhos de produtividade, ao mesmo tempo em que minimiza impactos ambientais. Além de reduzir custos de produção, com a diminuição de nitrogênio e fósforo, o manejo nutricional preciso facilita a obtenção da licença ambiental para a propriedade.  

Pesquisadores avaliaram, por um ano, dois grupos de vacas durante o período de lactação com dietas contendo teores de proteína diferentes. O Grupo 1 recebeu concentrado com 20% de proteína bruta. Já o Grupo 2 teve o teor proteico do concentrado ajustado de acordo com as exigências nutricionais e a produção leiteira. De acordo com o coordenador da pesquisa na Unidade, Julio Palhares, o objetivo foi conhecer o impacto dessa intervenção no balanço de nutrientes e nos indicadores de desempenho ambiental.

O manejo nutricional reduziu os excedentes de nutrientes, como o nitrogênio (N) e o fósforo (P). Para a zootecnista Táisla Novelli, que participou do estudo a campo, a nutrição de precisão é uma ferramenta a mais para auxiliar o produtor, com bons resultados na produção, além de benefícios ambientais.

Produtor satisfeito e meio ambiente conservado

Quando há consumo excessivo de nitrogênio por meio da dieta aumenta-se o risco ambiental. O nitrogênio nas fezes e urina tem potencial de volatilização, causando impacto na qualidade do ar, podendo contaminar o solo e as águas superficiais e subterrâneas. Já o fósforo é o elemento responsável pela eutrofização nos corpos d’água. Ou seja, em grande concentração na água, esses elementos podem alterar o ambiente aquático, com aumento da população de determinadas algas que irão depreciar a qualidade da água. 

A variação no concentrado oferecido ao grupo 2 reduziu o excesso de nitrogênio no sistema produtivo em 7,6%; e o de fósforo em 6,3%. No caso do potássio, o excesso foi maior nesse grupo 1. “A redução de excedentes dos nutrientes significa fazer uma pecuária ambientalmente eficiente, com isso o produtor terá mais facilidade no manejo dos resíduos e na obtenção da licença ambiental da fazenda. Os custos da produção de leite também são impactados. Com a quantidade ajustada de nitrogênio, produziu-se a mesma quantidade de leite da dieta com excesso do elemento. Isso significa redução do custo de produção, pela menor necessidade de aquisição do alimento proteico”, destaca Palhares. 

A maior parte do excesso de nitrogênio no grupo da dieta convencional vem da fertilização do solo e dos alimentos concentrados oferecidos aos animais. No caso do fósforo, do capim e do concentrado.

Resultados associam nutrição de precisão à redução de riscos ambientais

A estratégia nutricional dos animais, que leva em consideração a necessidade de nutrientes e a produção de leite, demonstrou-se eficiente na redução dos excedentes de nitrogênio e fósforo no sistema de produção da Embrapa Pecuára Sudeste.

O total de excesso de nitrogênio por hectare foi de 605 kg no grupo 1; e de 556 kg N por hectare no 2. Em ambos, os menores excessos foram verificados nos primeiros três meses da lactação. A eficiência média de uso de nitrogênio foi de 21% para o grupo 1; e de 22,7% para o grupo 2. O nitrogênio é de alta mobilidade no solo. Dependendo do manejo feito na pastagem e da intensidade de chuvas, ele pode ser transportado para os corpos d’água superficiais e subterrâneos. Conforme Palhares, o nitrogênio em elevadas concentrações na água é tóxico para humanos e animais que a consumirem. 

O alimento concentrado e a adubação das pastagens representaram a maior parte das entradas desse elemento.

Em relação ao fósforo, o total de excesso por hectare do sistema produtivo foi de 93 kg por hectare no grupo 1; e de 86 kg por hectare no grupo 2. A eficiência média de aproveitamento do fósforo no grupo 1 foi de 25,3%; e no grupo 2, de 26,5%. Os maiores excessos ocorreram no verão, nos dois grupos. “Tal fato está relacionado à proximidade do fim da lactação, onde a produção de leite estava reduzida, aliado ao possível consumo excessivo de fósforo pelos animais, principalmente via pastagem”, diz o pesquisador. O alimento concentrado ainda representou mais de 70% das entradas de fósforo para os dois grupos. 

Já o potássio não teve a mesma eficiência em relação aos outros dois nutrientes quando a dieta foi ajustada.

O total de excesso de potássio por hectare do sistema produtivo foi de 296 kg/ha no grupo 1; e de 322 kg/ha no grupo 2. Diferentemente do observado para o nitrogênio e para o fósforo, o consumo de concentrado não representou a maior entrada de potássio, mas o consumo de pastagem. O potássio apresentou uma eficiência média de uso de 14,2% para o grupo 1; e 1de 2,6% para o grupo 2. “O potássio não é um elemento com grande representatividade no impacto ambiental. É mais uma questão de uso correto do elemento de acordo com a exigência das vacas. Como todo nutriente custa dinheiro, então por que usar em excesso se não vai reverter em produção de leite? Ou seja, o produtor vai jogar dinheiro fora”, adverte Palhares.

Os resultados demonstram que a precisão no uso da proteína na dieta determinará menor potencial de dano ambiental, como poluição das águas e do solo e emissão de gases.

Ferramenta valiosa de análise ambiental

Segundo Palhares, no Brasil o balanço de nutrientes não é considerado pelo setor produtivo e pelos órgãos gestores como ferramenta de análise ambiental. “Essa realidade não se justifica, pois o balanço é um instrumento eficaz, considerado nos programa de gestão ambiental para pecuária de vários países do mundo”, explica. Novelli endossa a opinião do pesquisador da Embrapa, ressaltando que a abordagem do balanço de nutrientes mostrou-se adequada para explicitar a eficiência de uso de nutrientes pelos animais e avaliar o desempenho dos indicadores ambientais ao longo da lactação.

O balanço é eficiente porque mostra o desequilíbrio que pode ocorrer entre a quantidade de nutrientes utilizada pelo sistema de produção e a que é produzida na forma de leite. “O balanço expõe a eficiência de uso de nutrientes. Quanto maior a eficiência, melhor será o sistema de produção em termos ambientais e econômicos. Já os sistemas com baixa eficiência significam alto impacto ambiental e menos dinheiro no bolso”, conta Palhares.

Uma das vantagens de calcular o excedente de nutrientes por área ao mês, segundo o estudo, é que permite decisões mais acertadas em relação ao regime de fertilização das pastagens, levando-se em consideração o excedente do mês anterior. Isso reduz a necessidade de aquisição de fertilizantes químicos, diminuindo os custos de produção, otimizando o uso de resíduos de animais como fertilizantes, melhorando a segurança ambiental da fazenda e facilitando a adaptação às legislações ambientais.

Para Palhares, utilizar o balanço de nutrientes para avaliação da eficiência de uso de elementos como nitrogênio e fósforo no sistema de produção de leite é uma forma simples e acessível para evitar danos ambientais. “A partir do balanço eu posso identificar onde estou sendo ineficaz no uso dos nutrientes e intervir de forma precisa. Com isso se reduzirá a disponibilidade de nutrientes no ambiente, reduzindo o risco de poluição”, ressalta.

Ajuste de dietas diminui também a pegada hídrica

Essa pesquisa é um desdobramento de um estudo realizado em 2017, que apontou o ajuste nas dietas benéfico também para diminuir a pegada hídrica dos sistemas de produção animal. 

O assunto ainda foi tema de um artigo publicado na revista TAL com o título Nutrient fluxes and environmental performance indicators for a pasture-based dairy system

Fonte: Embrapa / Foto:Embrapa/Juliana Sussai