Um artista sertanejo comprometido com arte popular e a cultura do sertão. Assim podemos definirGildemar Sena Oliveira. Nascido no dia 29 de julho de 1957, em Juazeiro, na Bahia, filho de dona Maria Sena Oliveiraque trabalhava como auxiliar de serviços gerais. “Viemos de uma família bem pobre… Minha mãe e meus avós migraram de uma cidade chamada Bonita, hoje conhecida como “Ibiaporã”, e chegaram em Juazeiro nos anos 50”.
A infância foi ao ar livre, alternando entre os banhos no Rio São Francisco, a produção artística que já desenvolvia e o esporte preferido entre a meninada dos anos 60 que residia na região do Vale do São Francisco: o passarinhar.
– “Fui um moleque traquino. Essa questão minha artística já vem desde menino quando eu confeccionava meus próprios carrinhos, fazia minhas arraias, meus peões…Gostava também de “passarinhar”…Matar passarinho é uma grande besteira, mas naquele tempo a gente não sabia de nada”. O Rio São Francisco foi também um local onde tive muitos momentos de lazer. Com dez anos de idade eu já o atravessava nadando. Fiquei em Juazeiro até os meus dezesseis anos quando fui morar no Paraná.
Foi em Guaratuba, onde viveu entre os anos 1973 e 1977, que Gildemar foi apresentado ao Rock’n’roll, que é até hoje uma de suas grandes paixões. Nesse período também ele arriscou os seus primeiros rabiscos, já deixando sobressaltar o que viria a ser uma das suas grandes aptidões.
– “Lá no Paraná fiz meus primeiros desenhos, embora ainda criança já fizesse alguns rabiscos. Minha fonte de inspiração, inicialmente, foram os desenhos animados: Fred Flintstone, Manda Chuva, Pantera Cor de Rosa… Nessa época também tive o contato com o Rock’n’roll que é o ritmo que até hoje bate mais forte em mim. Fui fisgado inicialmente pela banda Slade. Depois conheci o Led Zeppelin, Pink Floyd, Black Sabbath, Eric Clapton, Jimmy Hendrix, Creedence…”, recorda.
De volta à sua terra natal, em 1978, foi aprovado num concurso da Fundação Nacional de Saúde. Lá permaneceu até março do ano passado quando se aposentou.
Em paralelo sempre esteve envolvido com arte e cultura. De volta à Bahia, em 1979, fez parte da equipe que produziu os adereços do filme “A Guerra de Canudos”. “De lá para cá fizemos, em parceria com Marcelo Rabelo e Joel Almeida, o “Calumby, Pífanos, Zambumba”, que é um vídeo documentário sobre das bandas de pífanos do sertão de Canudos. Fiz também a produção do filme “Cuitá: a pedra do Bendegó”, que é um filme documental de Marcelo Rabelo. Trabalhei com o cineasta argentino Carlos Pronzato no filme “Canudos – Uma longa a curva”, onde fiz a direção de arte”, conta o artista.
O Sertão – A história do Cangaço, de Canudos e as inúmeras manifestações culturais sertanejas são de fato um divisor de águas na trajetória de Gildemar que ao passar “a beber nessa fonte”, como ele mesmo conta, acabou ressignificando a sua obra e sua própria vida.
“Sempre estive bastante envolvido com a história de Canudos. Li vários livros, fiz poemas, músicas…Tenho algumas composições…Tenho também alguns cordeis editados, tais como: “Assim que se governa no Sertão”, “Belo Monte do Conselheiro”, “Falando de Lampião”, dentre outros. Sempre escrevi alguns versos. Logo no início da pandemia fiz algumas músicas e já passei para os parceiros. Estamos aqui entrincheirados nesse meio de caatinga”, explica.
“Tenho mais de 90 horas de imagens que retratam um pouco desse universo da cultura popular aqui da região de Canudos, Uauá, Monte Santo… Imagens sobre o Cangaço e alguns depoimentos de pessoas que apontam a passagem de Lampião aqui no município de Uauá. Tenho interesse de fazer um documentário contando a passagem de Lampião aqui por essas bandas. Tenho também uma história sobre o ultimo jagunço do Belo Monte, que quero transformar em um curta-metragem”, acrescenta Gil, como é também chamado em toda região.
Sua obra hoje vai muito além das fronteiras do sertão nordestino. Gildemar tem peças de sua autoria espalhadas por boa parte do mundo, tais como: Estados Unidos, Itália, Alemanha,Áustria, França, Espanha, Canadá, dentre outros países.
– “Em 2010, a convite da Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá (Coopercuc), fui para a Itália participar de um evento em Turim. Levei meus desenhos de bico de pena retratando as catadeiras de umbu. A receptividade foi muito boa. Daí em diante participei de várias exposições”.
Ao longo dos mais de quarenta anos de carreira coleciona prêmios:
“Em 2005, ganhei uma menção honrosa na 7ª edição da bienal do Recôncavo, em Cachoeira. No ano seguinte, ganhei um destaque no Salão Regional de Feira de Santana com a tela “Cordel a literatura do povo’. Nesse mesmo ano, a Fundação Cultural do Estado da Bahia pegou um desenho meu chamado “Folguedos” e colocou em seu cartão de natal. Em 2000 ganhei o Salão I terligado de Artes em Juazeiro com a tela “Musica Nordeste, Canudos e Mulher Rendeira”. Participei do filme “República de Canudos”, de Pola Ribeiro”.
Em 1997, durante as celebrações do Centenário de Canudos, quando ocupava o cargo de coordenador de Cultura do município de Uauá, o (ou e?) “produtor cultural” foi responsável pela montagem de peças teatrais alusivas à guerra. mostrou mais uma das suas inúmeras facetas. “Montei as peças “Canudos não morreu”, “Clemência: a terra que o sol rachou” e “Conselheiro: o líder camponês, onde todos os textos, direção e figurino foram feitos por mim”
Projeto – O Espaço Cultural Toque de Zambumba foi mais uma empreitada de sucesso na vida de Gildemar. Durante cinco anos, entre 2009 e 2014, o projeto abrigou artistas locais como Gereba, Wilson Aragão, Xangai, Maciel Melo, Juraildes da Cruz, Paulinho Jequié, Dudé Casado, que é uma banda de rock lá de Juazeiro do Norte, Marcelo Pantera e os Bruxos da Noite, de Olinda, João Sereno, Zecrinha (Senhor do Bonfim) Paulinho Jequié, Galeota das artes e Roberto Possídio, ambos de Curaçá, Renan Nenês, Claudio Barris, Marcos Canudos, esse últimos três de Canudos, Maviael Melo, Lourinbau e muitos outros artistas…
Atualmente, Gildemar administra o “Toque de Zambumba Confecções”, onde coloca seus desenhos estampados em peças de roupas. “A Toque de Zabumba Confecções” pode-se dizer que tem mais de quarenta anos. Comecei no dia da primeira Missa Pelos Mártires de Canudos, em 1983. Era uma coisa bem m ocasional, onde só fazíamos camisa para a celebração ou alguma coisa para o São João de Uauá… Não havia uma preocupação de manter a marca durante o ano todo. Depois que percebi que o espaço cultural não estava dando retorno, resolvi fazer as confecções de forma ininterrupta. Até então fazíamos somente camiseta de malha. Hoje, além das camisas, temos mochilas, sacolas, bolsas, calças, saias, vestidos, camisa de botão, adesivos…Tudo com a nossa estampa.”. As vendas são feitas de forma presencial e também pela internet, através do Instagram (ver perfil abaixo).
Casado há quarenta anos com a também artista Petinha, Gildemar tem hoje quatro filhos, seis netos (e mais um caminho). “Atualmente, depois que me aposentei, me dedico exclusivamente e à minha arte. Seja toque de zambumba, desenhos, pinturas…”Eu tenho um espinho de mandacuru na ponta do meu pensamento e a zabumba que bate forte e acorda todo o sertão”. Esse é o início de uma música e poema, de minha autoria, chamada “Estrovengas e facões” “, finaliza.
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Foto: Caio Felipe Dantas Mendonça