[Opinião] Uma emocionante cerimônia sem emoção

Por Nizan Guanaes

Antes de viajar todo mundo me dizia: Puxa, Nizan, ver a canonização de Irmã Dulce lá no Vaticano vai ser muito emocionante! Não foi. Foi histórico, foi inesquecível, foi interessante. Mas emocionante não foi.

Quando o papa Francisco assumiu, eu estava em Buenos Aires e fiquei muito emocionado de ver a ascensão de um papa argentino com o histórico bonito dele e que adotou o emocionante e midiático nome de Francisco.

Mas, a meu ver, a Cúria Romana está vencendo. Francisco chegou com a “vibe” de tirar a igreja da mão da Cúria e trazê-la para as mãos do povo. Mas foi abduzido pela burocracia da Igreja.

Não sou cretino. Não acho que a Igreja deva vender o Vaticano, mudar do latim para o rap, virar Big Brother.
Mas a cerimônia que eu assisti aqui no Vaticano certamente foi mais bonita na TV, na Bahia, na praia de Copacabana ou pelo mundo afora.

Aqui não foi. Aqui foi uma emocionante cerimônia sem emoção. A recomendação do locutor do Vaticano de que as pessoas não deveriam agitar bandeiras nem faixas é o resumo do que falo.
Nisto João Paulo 2 teve muito mais personalidade e carisma.

É óbvio que foi bonito ver o rosto de Irmã Dulce tremulando na porta do Vaticano. Tocava em minha cabeça a música que os artistas da Bahia fizeram para ela, passava em meu coração o vídeo de sua linda história. Mas a emoção estava nela, em Irmã Dulce, na agora Santa Irmã Dulce, e não na fria cerimônia.

Irmã Dulce começou sua obra num galinheiro, ela começou seu abrigo para pessoas necessitadas num espaço de um galinheiro. A santa começou tocando acordeom para presos. E cresceu abraçando bêbados, doidos, perdidos, quase mortos. Foi assim que ela construiu sua organização social que hoje tem um hospital de 40 mil metros quadrados e atende a 3 milhões de pessoas por ano.

Sou um homem de comunicação, e com este olho eu digo: a Igreja Católica tem um grave problema de comunicação. Ela se desconectou da ponta. A Igreja Católica começou como uma startup lá em Israel na qual um jovem visionário e 12 apóstolos desruptaram o Império Romano e o mundo.
Com os séculos, ela virou incumbente e desconectada do seu público: a pessoa comum. Desconectada daquelas senhorinhas da Bahia, do Paraná, de Alagoas. Que estão aqui em Roma rezando com tanta fé. Emocionadas numa cerimônia sem emoção.

Essas senhorinhas têm uma fé mais forte do que o euro e que o dólar. Vieram com suas poucas posses
porque amam o fundador desta Igreja.

Como homem de comunicação, eu recomendo à Igreja que volte ao galinheiro de Irmã Dulce, que toque o acordeom de Irmã Dulce e se reconecte com o seu rebanho.
A Igreja é uma ovelha perdida. E só seguindo os passos lindos de sua mais nova santa, só seguindo os passos lindos de Irmã Dulce, ela se reencontrará e aprenderá a falar de novo com seu rebanho.