Projeto oferece e mantém bolsas de estudos para crianças negras e indígenas para que tenham uma educação emancipadora e afrocentrada
“A bolsa oportunizou que eu e a minha família, porque tudo que vivemos lá, vivemos em família, crescêssemos juntos. Se não fosse esse projeto, não teria a oportunidade de contar sobre o impacto tão positivo que a Maria Felipa promove para todas/os/es nós, para a subjetividade da minha filha. Esse é um legado para ela como mulher negra”, afirma Mila Costa , mãe da Maya Costa, bolsista do projeto Adote um/uma Educande, da Escolinha Maria Felipa.
Famílias residentes em bairros periféricos ou quilombos urbanos poderão concorrer a 05 bolsas para uma educação com perspectiva coletiva, emancipadora, que liberta e é equânime para suas crianças, através da terceira edição do Adote um Educande, a partir do dia 12 de outubro. A Escolinha Maria Felipa, escola de educação infantil e ensino fundamental, afro-brasileira e trilíngue – português, inglês e libras (@escolinhamariafelipa) abre o edital (@escolinhamariafelipa – https://linktr.ee/MariaFelipa ) para crianças negras e indígenas em situação de vulnerabilidade, com renda familiar de até 1,5 salário mínimo.
As inscrições para concorrer às bolsas estudantis, divididas em duas para o grupo dois, duas para o grupo três e uma para o grupo cinco, podem ser realizadas até o dia 01 de novembro. O projeto, que existe na escola desde 2019 e já beneficia 10 crianças, busca abrir possibilidades futuras para a vida das pessoas negras e índigenas, que ainda hoje vivem o genocídio múltiplo, fisíco, dos conhecimentos, matrizes religiosas e memória, trabalhando desde a infância.
O Adote um Educande tem relação direta com a idealização da Escola, a primeira escola afro-brasileira do Brasil, que com uma formação afrocentrada e decolonial pretende reconstituir o tempo presente e dar coletivamente novos passos a uma emancipação social não só oferecendo a bolsa, mas custeando os materiais didáticos pedagógicos, aconselhamento psicológico de cada criança contemplada. O projeto é um compromisso social que a Escola estabelece com a sociedade e com as famílias que vão crescendo junto com a trajetória da instituição, que se organiza para acompanhar a criança até onde puder.
“Pensamos em atingir a criança no sentido mais amplo, no acesso e permanência na Escolinha, além da transformação das famílias a partir do projeto, pois acreditamos que a educação deve ser com plena participação e acolhimento de todas(os). Então, se uma criança se atrasa, se algo está acontecendo, buscamos dar suporte, amparo, para além das bolsas. É importante para nós compreender que não é a bolsa pela bolsa”, disse Lorena Dias, secretária da Escola.
A instituição que busca ser um instrumento transformador na memória de nossas crianças e entende que grande parte da população negra vive em condições de trabalho subalternizadas, tem a preocupação de aproximar essas pessoas que não podem acessar a EMF pagando as mensalidades, ainda que seja abaixo dos valores das demais escolas particulares. “Compreendemos que não teríamos conosco essas famílias em situação de maior vulnerabilidade e a criação do Adote um Educante é justamente para que possamos ter suporte para geração e manutenção dessas bolsas e do objetivo da EMF de fazer diferença na vida da população negra a partir de referências e representatividade positivada”, trouxe Bárbara Carine, idealizadora e consultora pedagógica da Escolinha.
Com dez crianças já contempladas nas edições anteriores, é através do catarse que a adoção acontece, mediante doações coletivas do público externo no site de financiamento coletivo ( https://www.catarse.me/adote_umx_educandx_maria_felipa_ae78? ), possibilitando que a manutenção da educação delas aconteça. É doando mensalmente, a partir de cinco reais que qualquer pessoa pode contribuir para que a instituição mantenha acesa a chama do possível sonho da superação das discriminações, preconceitos e violências, consequentes do racismo, machismo e lgbtfobia, através da educação. É possível doar também por meio de assinaturas mensais automáticas e transferências bancárias.
Para a mãe Janice Pereira, ter a sua filha Kaiala, uma das dez bolsistas do programa, estudando na Maria Felipa é a realização de um grande sonho e a certeza de uma educação forte, onde ela vai aprender muito sobre a cultura dela. “Ter ela lá é formar uma mulher negra mais fortalecida, é uma oportunidade única e já vemos esse impacto dentro de casa, na forma de Kaiala se colocar e saber o papel dos negras/os/es na sociedade. Essa bolsa trouxe mudanças a toda nossa família. Projeto como o Adote Um Educande nos faz fortes enquanto povo”, completa Janice Pereira.
O processo seletivo – dividido em 3 fases: 1) Envio da documentação por e-mail, 2) Avaliação diagnóstica da documentação, 3) Entrevista pela comissão avaliadora – está aberto até o dia 01 de novembro. Os inscrites devem enviar para o email Escolinha (escolinhamariafelipa@gmail.com) o RG e CPF do grupo familiar (residentes da mesma casa), documentação da criança, uma foto 3×4, cartão de vacina, documentos de comprovação de vulnerabilidade social (CadÚnico ou Cartão Bolsa Família), comprovação de renda ou ausência de renda, carteira de trabalho, últimos três contracheques, comprovante de residência (caso seja alugada, fazer declaração assinada com o próprio punho). Para ter acesso direto ao Edital os interessados podem acessar o perfil do Instagram da instituição (@escolinhamariafelipa).
Escola Maria Felipa
A Escola Maria Felipa é a primeira escola afrobrasileira do país, é trilíngue – português brasileiro, inglês e libras e funciona até o segundo ano do ensino fundamental. Com matrículas abertas, retornou com as aulas presenciais dia 30 de agosto, num sistema híbrido – online e presencial, respeitando todos os protocolos de prevenção à Covid-19, com equipe de profissionais totalmente vacinada e a partir da escolha de cada família. A instituição de ensino infantil é afroreferenciada, decolonial, valoriza a diversidade e carrega o nome de uma mulher, uma referência histórica de força, luta e liderança, como compromisso à ancestralidade africana.
Localizada em Salvador, cidade mais negra do mundo fora do continente africano, a EMF foi criada em 2017 por Bárbara Carine, idealizadora e consultora pedagógica da instituição, no processo de adoção de sua filha, uma criança negra. A instituição surge para todas as crianças a partir da grande preocupação da família em promover uma educação escolar que estivesse fora dos marcadores historiográficos eurocêntricos e subalternizados de existências não-brancas, ao perceber que esse lugar não existia.
Além das ações regulares e do Adote um Educande, a escola desenvolve uma série de outras atividades vinculadas a prática antirracista, como a Afroeducativa, que são formações pedagógicas para as relações étnicas-raciais destinadas a formação de pessoas interessadas na temática, consultorias para entidades de setores públicos e privados preocupados com a superação do racismo nos diferentes complexos sociais.
A instituição ainda desenvolve materiais didático-pedagógicos antirracistas, disponíveis na lojinha virtual da escola. Em sua organização didático-pedagógica, cada turma é nomeada por um reino/império africano que norteará os estudos dos grupos, sendo eles, Império Inca (G2 – 02 anos), Reino Daomé (G3 – 03 anos ), Império Maia (G4 – 04 anos), Império Ashanti (G5 – 05 anos) e Reino de Mali (1° ano fundamental). A partir de 2022, a Maria Felipa passa ofertar a turma do 2° ano fundamental.