[Opinião] Ceplac e Embrapa; afogamento e morte anunciadas!

Por Manoel Moacir Costa Macêdo*; Itatelino de Oliveira Leite Júnior**; Manoel Malheiros Tourinho***

A história como ciência carrega entre outros, dois relevantes fundamentos metodológicos. O primeiro é o registro, o segundo o movimento. Vieses existem em ambos, pela abstração dos vencedores e inconstância da temporalidade. Fraquezas aceitas com ressalvas no método histórico. Em menos de um ano, o circuito da região cacaueira da Bahia, berço do ciclo virtuoso do cacau e das contradições dos monocultivos, aplaudiu e até acreditou na notícia: A Embrapa e a Ceplac (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira) assinaram um acordo de cooperação técnica para implantação de uma Unidade Mista de Pesquisa e Inovação (Umipi), com sede no Centro de Pesquisas do Cacau (Cepec/Ceplac), em Ilhéus (BA). A Umipi Cacau vai centralizar os estudos científicos nessa área, abrangendo também os estados de Pará e Rondônia. O objetivo é fortalecer as ações de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) em prol da cadeia produtiva de cacau no Brasil, o que envolve ainda a criação de um portfólio para garantir os trabalhos em parceria já existentes e incentivar a formação de novos projetos voltados à essa cultura”.

Pelo olhar pouco atento à história das organizações e os ciclos dos monocultivos no Brasil, a nota embriagou os otimistas. O encontro tardio, entre duas organizações com histórias de sucesso, animou o moribundo ambiente da cacaiucultura e em particular o entorno da CEPLAC. Com realismo, experiência e sinceridade dois dos autores, um oriundo da EMBRAPA e outro da CEPLAC, no artigo de opinião “Abraços de afogados” comentaram a proposta patrocinada pelo Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA e CEPLAC, que entre outras considerações escreveram: “[…] os atores formais desse arranjo organizacional, apresentaram propósitos ambiciosos e desprovidos de referenciais programáticos no âmbito das partes, na sua operabilidade para prospectar os propósitos […]”. Com pesar e respeito aos próprios sentimentos de uma longa vida nessas organizações, concluíram que “[…] sem um efetivo diagnóstico organizacional para identificar as ameaças e falhas, a “boia salva-vidas” atirada ao mar para resgatar dois moribundos, não vai salvá-los. Um agonizando e o outro está deveras enfermo. Se a boia estiver furada, só resta o abraço dos afogados”.

Fatos recentes evidenciaram no curto prazo as referidas conclusões. O que parecia futuro, se tornou precocemente em realidade. Não é mais suposição, mas efetividade. A simbólica fotografia divulgada “de um servidor em trajes da CEPLAC, de costas para os indiferentes passantes, atrelado numa modesta escada, retirando ‘letra a letra de C a C’ as palavras que compõem a histórica marca CEPLAC” do outrora imponente prédio em Ilhéus, “capital do Sul da Bahia”, dos coronéis do cacau, das venturas, da riqueza e dos romances épicos e eróticos de Jorge Amado, a exemplo de “Cacau e Gabriela Cravo e Canela”, causou choque, tristeza e indignação. Por que tanta violência? Um retorno ao passado, não parece real, mas um pesadelo o descaso perante um símbolo de pujança da região cacaueira, na rota do anunciado “afogamento e morte”. Não é uma morte digna de uma organização valorosa, mas uma morte cruel como de um animal a caminho do abatedouro resignado em passividade obsequiosa. Antes mataram outras estruturas vinculadas à cacauicultura, como o Instituto de Cacau da Bahia – ICB, o Conselho Nacional dos Produtores de Cacau – CNPC, a Cooperativa Central do Cacau Ltda – COOPERCACAU e os Sindicatos dos Produtores de Cacau, entre outras. Resta ainda o envelhecido Centro de Pesquisas do Cacau – CEPEC, que há mais de trinta anos não renova o quadro de servidores e enquadrou todos os seus pesquisadores como fiscais agropecuários federais.

Da parte da EMBRAPA, a realidade não é diferente, apenas a sutileza dos atos e do tempo, uns velados e outros escancarados, ambos na direção do desmonte institucional, a exemplo das reduções orçamentárias, da carência de investimentos e do cancelamento dos estratégicos treinamentos no exterior. Uma diferença de tons e doses em relação a CEPLAC. A EMBRAPA em sua completude, tem sido incapaz de reagir e alterar a anunciada “morte por afogamento”. O seu modelo organizacional está distanciado da problemática ambiental, dos modos de produção alternativos das diversas agriculturas e da saúde integral como um novo padrão de produzir e consumir. As recentes “falsas controvérsias” aguçou às críticas da comunidade científica, ao mesmo tempo em que afloraram pela via privada as ameaças de transformações de algumas de suas funções. Numa quadra social onde o conhecimento tornou-se estratégico à humanidade, afora agregar valor aos bens e processos, o Brasil não pode prescindir de duas organizações públicas de ciência, tecnologia e desenvolvimento rural, antes ameaçadas em “abraços de afogados”, ora no andor sepulcral de “mortes anunciadas”.

*Engenheiro agrônomo, ex-pesquisador e ex-dirigente de unidades centrais e descentralizadas da EMBRAPA (manoelcmacedo@gmail.com);

**Engenheiro agrônomo e ex-extensionista rural da CEPLAC (italeitejr@yahoo.com.br); 

***Engenheiro agrônomo, professor emérito da Universidade Federal Rural da Amazônia – UFRA, ex-dirigente da CEPLAC e ex-diretor executivo da EMBRAPA (paratourinho@gmail.com).