No Nordeste as mulheres estão na gestão de 57% do total das propriedades rurais. Presença também é marcante em todas as atividades da agropecuária

As mulheres vêm conquistando cada vez mais espaço em todos os setores da sociedade e quando se trata de agronegócio a conversa não é diferente. Elas representam mais da metade desse ecossistema que sustenta indicadores positivos, e sua performance não se mensura apenas pela garra no enfrentamento do trabalho duro e pesado, mas também pelos avanços em busca da equidade de gênero. A defasagem de pesquisas no Brasil contribui para a falta de dados atuais, porém, os indicativos das análises setoriais realizadas entre o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Embrapa e o IBGE, há muito, vêm mostrando avanços positivos. Em 2017, o censo agropecuário do IBGE identificou o total de 947 mil mulheres responsáveis pela gestão de propriedades rurais, de um universo de 5,07 milhões, e as mulheres nordestinas são maioria: 57%.

Esses números representam os avanços proporcionados por uma luta que vem de muito tempo. A partir do final do século XX, teve incremento a batalha das mulheres por um espaço maior na sociedade, a busca por um lugar onde elas não fossem vistas apenas como coadjuvantes, como em tempos passados. E muito foi conquistado nesse processo. Um exemplo disso é a ministra Tereza Cristina, engenheira agrônoma formada pela Universidade Federal de Viçosa (Minas Gerais) e que desde 2019 está à frente do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). E ela é apenas um exemplo entre muitos outros que podem ser citados.

Para o gestor da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura (Seagri), João Carlos Oliveira, a presença efetiva das mulheres no campo motivou a organização frente as dificuldades enfrentadas em consequência dos problemas estruturais: “A participação da mulher nos negócios do campo sempre foi presente e essencial. E ainda exercendo, essa guerreira, dupla jornada de trabalho, pois, além da labuta na lavoura, sempre lhe cabe muito da responsabilidade pelos afazeres domésticos, quando não toda. E isso sem esquecer que também só cresce o número de mulheres profissionais em áreas como agronomia, veterinária, biologia, zootecnia, dentre outras, todas ligadas ao campo. O agronegócio definitivamente muda para melhor com a presença destacada das mulheres”, comenta o secretário de Estado.

São personalidades como Solange Brito Santos (foto), 45, liderança do Assentamento Terra Vista, localizado em Itamaraju, extremo sul da Bahia. Ela une forças com outras parceiras da Rede de Mulheres Arte da Terra, no plantio e cultivo de essências florestais para a produção de óleos essenciais. Apaixonada pelo seu trabalho, ela afirma que produto bom é produto cultivado no campo: “Tudo o que é belo existe no campo. O produto saudável e de qualidade parte da produção de um povo que vive do campo”, enfatiza.

Solange é defensora da agroecologia. Segundo a definição da produtora, a atividade é um modo de vida que possui ligação intima com as mulheres do assentamento em que vive. É a afirmação do entendimento de que as mulheres produzem vida. Ainda segundo ela, a agroecologia é uma forma de conhecimento que pretende superar os danos causados à biodiversidade e à sociedade como um todo pela prática da monocultura.

Mãe, trabalhadora, militante – Mãe do Victor Uallas, 24, Solano Kunta Kinte, 22, e avô da Flora Sofia, 2, filha do caçula, Kinte. Esse é um dos caminhos para se conhecer um tanto de Solange Brito Santos, que é natural do povoado de Nova Alegria, distrito de Itamaraju, interior da Bahia. Outrora, quando ainda criança, em decorrência do falecimento do seu pai, Antônio José, acompanhou a sua mãe, a senhora Filomena Brito, num êxodo para urbanização do município de Itamaraju, na busca de melhores condições de vida.

O amor pela terra a fez, com o passar dos anos, a retornar para a zona rural. Ainda na juventude, criou interesse pelo movimento MST e passou a compreender os processos de luta pela terra, em processo que avivava em sua memória a própria infância, tempo de uma vida ativa na roça. Nesse processo, aos 20 anos de idade Solange passou a morar no Assentamento Terra Vista, onde constituiu família e reside até hoje. É lá, juntando seus esforços aos de outras mulheres, que ela toca a produção de óleos essenciais.

Solange se diz muito satisfeita com seu trabalho. Junta-se, assim, ao grupo de 93% das trabalhadoras da área rural que se dizem orgulhosas em atuar no campo. Nesse ambiente, elas também se sentem ouvidas (72%) e produtivas. São resultados de conquistas diárias, difíceis, mas cumulativas. Atualmente, 79% das mulheres do campo afirmam que a situação delas no ambiente Agro é melhor atualmente do que há dez anos. Mas ainda há muito a avançar. Para dar mais visibilidade à atuação feminina no setor e acabar com a desigualdade de gênero, 90% acreditam que é necessário dar mais visibilidade a projetos de sucesso e às contribuições das mulheres para a agricultura, conforme pesquisa realizada através do portal agroligadas.

Diferença salarial entre gêneros – Mesmo com a percepção do aumento da participação e do conjunto de benefício trazidos com a inserção das mulheres no agronegócio, percebe-se uma diferença salarial entre o sexo feminino e o masculino. Assim como no mercado de trabalho em geral, no setor do agronegócio as mulheres possuem uma média salarial menor, em uma equiparação aos homens. Pesquisa de 2018 do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), organismo da Esalq/USP, mostra que essa diferença salarial, em média, é de 26%.

Na Bahia, dos 417 municípios, apenas 43 possuem cargos de secretariados do setor Agro comandados por mulheres. Isso representa apenas cerca de 10% do efetivo geral. Há, nesse quesito, então, ainda muito a avançar. Mas uma coisa é certa: aos poucos elas vão encontrando modos de derrubar barreiras e preconceitos, mostrando-se como força de trabalho essencial para um desenvolvimento cada vez maior desse setor importante da economia nacional.

Por Ascom Seagri / Foto: Divulgação