TSE tem 3 a 1 contra Bolsonaro; voto de Cármen Lúcia poderá formar maioria por inelegibilidade

Os ministros do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares seguiram o relator Benedito Gonçalves e votaram nesta quinta-feira (29) pela inelegibilidade de Jair Bolsonaro (PL) até 2030.

Agora, o placar é de 3 a 1 contra o ex-presidente, dependendo de apenas mais um voto para a formação de maioria pela inelegibilidade. Faltam votar outros 3 integrantes do tribunal: Cármen Lúcia, Kassio Nunes Marques e Alexandre de Moraes.

A sessão do TSE foi interrompida e será retomada nesta sexta-feira (30), a partir das 12h.

A ação do PDT foca a reunião no ano passado na qual o ex-presidente reafirmou mentiras sobre as urnas eletrônicas a embaixadores estrangeiros.

O processo mira Bolsonaro e Walter Braga Netto, ex-ministro que foi candidato a vice na chapa derrotada do PL à Presidência em 2022. Já foi formada maioria, porém, contra a inelegibilidade de Braga Netto —os quatro ministros que já votaram tiveram esse entendimento.

Floriano e Tavares são professores da USP e assumiram o cargo de ministro em maio, em uma mudança na composição da corte influenciada pelo presidente do TSE, Alexandre de Moraes.

Para Floriano, o comportamento de Bolsonaro na reunião com os embaixadores já é suficiente para reconhecer o abuso de poder e o desvio de finalidade do então mandatário no encontro com representantes estrangeiros.

O magistrado disse que houve uma “quebra da liturgia presidencial” por parte do ex-presidente. “Analisando linha a linha me convenci que teve claro objetivo eleitoral, não no sentido apenas de questionar o sistema eleitoral sem provas ou consistentes evidências, mas de angariar proveitos eleitorais em desfavor de seus concorrentes”, afirmou.

Ele também aceitou a inclusão da minuta golpista encontrada na casa do ex-ministro Anderson Torres e outros elementos nos autos do processo, mas disse que, “embora execráveis”, esses fatos não são necessários para a avaliar a controvérsia.

Floriano afirmou que, em respeito à jurisprudência firmada no caso do ex-deputado estadual Fernando Francischini, cassado por ter espalhado mentiras sobre as urnas, também é necessário tornar Bolsonaro inelegível.

Segundo ele, o tribunal dará uma “pirueta” caso não dê ao processo do ex-presidente o mesmo destino da ação sobre o ex-parlamentar paranaense.

“Se um candidato a deputado estadual que fala as mesmas inverdades que presidente é censurado e tornado inelegível, e vamos combinar que potencial de candidato a deputado no Paraná é menor que de presidente, como a corte vai decidir que mesmo teor do discurso não é suficiente para sanção de inelegibilidade?”, disse.

“O que de mais grave pode existir que acusar, buscando repercussão internacional, três ministros da Suprema Corte de serem asseclas de criminosos e terroristas? O que pode ser mais grave que achincalhar perante representantes estrangeiros o regime democrático e dizer que um de seus pilares, as eleições livres, são forjadas e ardilosamente manipuladas?”, questionou Floriano.

Já Tavares disse que houve “não apenas a mera falta de rigor em certas proclamações, mas a inequívoca falsidade perpetrada nesse ato comunicacional, com invenções, distorções severas da realidade, dos fatos e dos dados empíricos e técnicos”.

Ele afirmou que as falas do ex-presidente chegaram “a caracterizar uma narrativa delirante, com efeitos nefastos na democracia, no processo eleitoral, na crença popular em conspirações acerca do sistema de apuração dos votos”.

Antes deles, o ministro Raul Araújo havia votado contra a inelegibilidade do ex-presidente.

Em linhas gerais, Raul relevou o golpismo de Bolsonaro ao longo de seu mandato, tratando-o como algo de conhecimento de todos, buscando assim tirar peso da reunião com embaixadores de 2022 na qual o então presidente mentiu e proferiu ataques ao sistema eleitoral.

Raul vinha sendo pressionado por Bolsonaro a apresentar um pedido de vista (quando um ministro solicita mais tempo para analisar um caso), o que suspenderia o julgamento. Ele optou, porém, por dar prosseguimento à análise da ação.

Raul votou para que o TSE não leve em consideração no julgamento a minuta golpista encontrada na casa de Torres. Ele afirmou que o documento não tem relação com a ação apresentada pelo PDT, que requer a inelegibilidade de Bolsonaro por ter convocado uma reunião com embaixadores para desacreditar, sem provas, o sistema eleitoral.

Também integrante do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Raul é conhecido por adotar um viés mais tradicionalista em julgamentos e por sua proximidade com o campo político conservador.

Raul disse que votou inicialmente a favor da inclusão do documento nos autos para que fosse possível aprofundar a investigação se havia relação entre a minuta e o processo em curso. No entanto, agora, concluiu que “não há nexo” entre os casos.

“Inexiste qualquer elemento informativo capaz de sustentar, para além de ilações, a existência de relação entre a reunião e a minuta de decreto, a qual apócrifa e sem origem e sem data determinadas persiste de autoria desconhecida, a impedir qualquer juízo seguro de vinculação daquele achado com o pleito presidencial de 2022 e com os investigados”, disse.

“Sem prejuízo da opinião pessoal de cada indivíduo sobre a quem compete a responsabilidade política dos episódios, sob o viés jurídico não há nexo de casualidade entre os fatos”.

O ministro iniciou o voto pregando a diferença entre a função do TSE de “governança” da realização das eleições e a atribuição de ser o juiz das controvérsias eleitorais. Segundo ele, no primeiro caso, a corte acertou ao ser incisiva no combate às fake news relativas às urnas eletrônicas.

Ao julgar o comportamento dos candidatos, porém, ele afirmou que o tribunal deve aplicar a autocontenção e o máximo respeito à soberania popular de escolher o candidato que preferir.

Segundo ele, Bolsonaro fez afirmações inverídicas no evento com embaixadores e teve excessos verbais, mas “nem todo o discurso [de Bolsonaro na ocasião] veicula afirmações inverídicas, estando igualmente presentes naquela manifestação trechos nos quais o investigado apenas expõe sua opinião política sobre temas abertos ao diálogo institucional público”.

“Em especial, a discussão sobre o chamado voto impresso, as críticas às instituições e ao então potencial concorrente ao cargo presidencial. Censuráveis, não por seu conteúdo, mas por configurarem propaganda eleitoral antecipada, portanto, irregular”, continuou.

O ministro afirmou ainda que as declarações de Bolsonaro não foram capazes de reduzir a presença de eleitores no pleito e, portanto, não afetaram a normalidade do pleito.

Na terça, o relator no TSE afirmou que não é possível fechar os olhos para discursos antidemocráticos com mentiras e discursos violentos, criticou a banalização do golpismo e destacou a epopeia de ataques do ex-presidente com uso da imagem das Forças Armadas.

Benedito defendeu que seu voto seja encaminhado ao TCU (Tribunal de Contas da União) e para inquéritos criminais em curso no STF (Supremo Tribunal Federal) para apurar se cabem investigações contra Bolsonaro pelas condutas em debate para além da Justiça Eleitoral.

O advogado do ex-presidente, Tarcísio Vieira de Carvalho, já admite recorrer ao STF em caso de derrota no na corte eleitoral.

A ação contra Bolsonaro é uma Aije (ação de investigação judicial eleitoral), que pode ser apresentada até a data da diplomação do candidato.

Esse instrumento tem como objetivo apurar condutas que possam afetar a igualdade de disputa na eleição, como abuso de poder econômico, de autoridade ou uso indevido dos meios de comunicação social em benefício de um candidato.

Segundo a defesa de Bolsonaro, a ação movida pelo PDT é “impostora e eivada de falsidade ideológica” e não está em julgamento o movimento político representado pelo ex-mandatário.José Marques/Matheus Teixeira/Folhapress