O procurador-geral da República, Augusto Aras, quer fatiar o inquérito das fake news e abrir uma investigação específica sobre a afirmação do ministro da Educação, Abraham Weintraub, de que, por ele, prenderia todo mundo, “começando pelo STF”.
O pedido vai ser encaminhado ao Supremo Tribunal Federal antes da sessão que julgará, no próximo dia 10, a legalidade das apurações que visam identificar responsáveis pela disseminação em massa de notícias falsas e ameaças a integrantes da corte.
Na visão do PGR, o desmembramento seria uma solução para que haja uma delimitação mais precisa do objeto da investigação em curso no Supremo.
Nesta quinta-feira (4), a colunista Mônica Bergamo antecipou o teor de memorial encaminhado ao Supremo em que Aras faz duras críticas à abrangência do inquérito.
Na manifestação, Aras defende a continuidade da investigação, mas afirma que são necessárias “medidas mínimas” para que compatibilizá-la com “a Constituição Federal e a lei vigente”.
O procurador-geral cita a necessidade de se permitir que o Ministério Público Federal participe das apurações e solicita que procedimentos como quebra de sigilo, busca e apreensão e vedação de uso de redes sociais passem pelo crivo do MPF.
Para o procurador-geral, há uma “exorbitância” em relação ao alvo das investigações.
“O inquérito, que já ultrapassou 6 mil páginas no volume principal e mais 74 apensos, revela que, sob a motivação da condução de investigações de fake news contra a Suprema Corte, detém objeto cambiante, periodicamente modulado, para alcançar fatos e pessoas distintas, em pontos de investigação separados em apensos dos autos sem qualquer relação de conexão”, disse.
O PGR também volta a questionar a atuação do ministro Alexandre de Moraes à frente das investigações. Ele contesta por que o mesmo ministro relata fatos que, em muitos casos, não têm relação entre si e deveriam ser distribuídos por sorteio.
“Hoje, o processo já conta com 74 apensos, cada um tratando de fatos distintos e sem nenhuma conexão entre eles, revelando o procedimento de irem sendo juntados aos mesmos autos, sob mesma numeração e mesma relatoria, novos apensos, cada um contendo novos fatos, envolvendo pessoas ou grupos de pessoas distintas”, pondera.
O procurador afirma que o inquérito tem 10 mil páginas, entre o volume principal e 74 apensos. E que “apenas cerca de 2% delas [páginas] consistem em elementos de prova com indícios de participação de pessoas com prerrogativa de foro”.
De acordo com a PGR, 90% desse material já foi desmembrado do inquérito principal e redistribuído a instâncias inferiores, competentes para julgar pessoas sem foro privilegiado.
O movimento para abrir uma investigação à parte relacionada a Weintraub pode tirar o caso das mãos de Moraes.
O ministro da Educação entrou na mira do inquérito das fake news após o ministro Celso de Mello levantar o sigilo de reunião ministerial de 22 de abril citada pelo ex-ministro Sergio Moro como uma das provas de que o presidente Jair Bolsonaro desejava violar a autonomia da Polícia Federal.
No encontro, Weintraub diz ter ojeriza de Brasília, em referência às negociações políticas, e faz críticas ao Supremo. “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF.”
A Polícia Federal foi até o Ministério da Educação colher depoimento dele sobre o caso no último dia 29, mas o ministro permaneceu calado. Na decisão em que determinou a oitiva de Weintraub, Moraes ressaltou que há indícios de que o responsável pelas políticas educacionais do governo federal cometeu seis crimes que preveem até 20 anos e 4 meses de prisão.
Pessoas com acesso às investigações avaliam que a tendência é do Supremo redistribua o apenso 74, que apura a declaração de Weintraub.
Os indícios envolvendo os parlamentares estão no apenso 70 que deve continuar nas mãos de Moraes. Além de deputados, apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e empresários são investigados por supostamente disseminarem fake news.
O restante da documentação se refere a “atos supostamente criminosos perpetrados por centenas de cidadãos” contra a Corte. Os relatos vão desde ameaças a ministros a disseminação de ataques nas redes sociais.
Nesta quinta-feira, Weintraub prestou novo depoimento à PF, mas no âmbito do inquérito em que é investigado por afirmações nas redes sociais supostamente preconceituosas com a China.
O inquérito das fake news é alvo de críticas desde que foi instaurado, em março de 2019, por ter sido aberto pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli, de ofício, ou seja, sem provocação da PGR. Além disso, Moraes foi escolhido relator sem sorteio.
Toffoli, porém, usou o artigo 43 do regimento interno da corte, que tem força de lei e trata da polícia do tribunal, para justificar a abertura das investigações. O dispositivo prevê que, caso ocorra “infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal”, o presidente pode instaurar inquérito e designar um relator.
Folhapress