Cientistas do Laboratório Nacional de Los Alamos na Califórnia, nos Estados Unidos, identificaram uma nova mutação do coronavírus. De acordo com o estudo preliminar veiculado recentemente na plataforma bioRxiv, que reúne estudos científicos antes da revisão por especialistas e da publicação formal em revistas científicas, essa versão é mais contagiosa que o vírus original, responsável pelo início da pandemia em Wuhan, na China. Em pouco tempo, tornou-se a versão dominante em diversos países, como Itália e Estados Unidos.
De acordo com a equipe, a mutação afeta as proteínas exteriores do vírus. Chamadas “spikes”, elas são responsáveis pela entrada do vírus nas células. “A história é preocupante, pois vemos uma forma mutada do vírus emergindo muito rapidamente e, durante o mês de março, se tornando a forma pandêmica dominante”, escreveu a bióloga computacional de Los Alamos Bette Korber, líder do estudo, em sua página no Facebook.
A nova cepa, que recebeu o nome de D614G, apareceu na Europa em fevereiro, migrou para a costa leste dos EUA e desde meados de março é a forma dominante do vírus nos Estados Unidos e na Europa. Entretanto, os pesquisadores ainda não sabem o que isso significa. Por exemplo, dados do Reino Unido mostraram que pessoas com essa mutação específica pareciam ter uma quantidade maior do vírus em suas amostras. Por outro lado, não há evidências de que essas pessoas apresentaram quadros mais graves ou um tempo de internação maior.
No momento, a maior preocupação, segundo a equipe, é o possível impacto dessa – e de outras mutações – no desenvolvimento de vacinas e tratamentos contra o novo coronavírus. Atualmente, mais de 100 vacinas em desenvolvimento e, na maioria das vezes, os cientistas partem do pressuposto que o coronavírus não sofreu nem sofrerá grandes mutações, a ponto de impactar a eficácia do imunizante.
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Entretanto, é justamente isso que os pesquisadores do Laboratório Nacional de Los Alamos temem. Embora o estudo ainda precise ser revisado por especialistas que não estão envolvidos no estudo, os autores afirmam que a descoberta representa uma “necessidade urgente de um alerta precoce”. Segundo eles, se o coronavírus não desaparecer no verão no hemisfério norte – como a gripe sazonal -, ele poderá sofrer mutações ainda maiores, o que poderia limitar a eficácia das vacinas e tratamentos desenvolvidos atualmente.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores de Los Alamos trabalharam em conjunto com cientistas das Universidades Duke, nos Estados Unidos, e Sheffield, na Inglaterra. Ao analisarem a sequências de coronavírus incluídas na Global Initiative for Sharing All Influenza, uma organização que promove o rápido compartilhamento de dados de todos os vírus influenza e coronavírus, eles identificaram 14 mutações do novo coronavírus.
Dessas, apenas a D614G foi considerada uma “preocupação urgente” no momento. Segundo eles, além de se espalhar rapidamente, ela pode deixar os “indivíduos suscetíveis a uma segunda infecção”.
Mutações anteriores
Essa não é a primeira vez que pesquisadores identificam mutações no novo coronavírus. No início de março, pesquisadores da China descobriram que um tipo mais agressivo do novo coronavírus representava cerca de 70% das infecções, enquanto as outras 30% estavam ligadas a um tipo menos agressivo.
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Outro estudo da Universidade College London, no Reino Unido, identificou 198 mutações recorrentes no vírus. “Mutações em si não são uma coisa ruim e não há nada que sugira que o Sars-CoV-2 esteja sofrendo mutações mais rápidas ou mais lentas do que o esperado. Até agora, não podemos dizer se o SARS-CoV-2 está se tornando mais ou menos letal e contagioso.”, disse François Balloux, um dos autores.
Um terceiro estudo, feito pela Universidade Estadual do Arizona, nos EUA, descobriu uma grande exclusão de DNA em um gene chamado ORF7a, na amostra de um paciente. Esse gene é responsável por criar uma proteína que ajuda o vírus a infectar, replicar e se espalhar pelo corpo humano.
Alegações “infundadas”
Por outro lado, nesta quarta-feira, pesquisadores da Universidade de Glasgow, na Escócia, consideram essas alegações “infundadas” e afirmam que nenhuma versão do vírus atualmente em circulação é mais ou menos potente que outra. A equipe do Centro de Pesquisa de Vírus analisou um catálogo de 7.237 mutações registradas no coronavírus durante a pandemia.
Segundo eles, embora isso possa parecer uma grande mudança, é uma taxa de evolução relativamente baixa para um vírus infeccioso como o Sars-CoV-2, nome oficial do novo coronavírus. Após analisarem as mutações, eles afirmaram que é improvável que alguma tenha significado funcional e não representam tipos diferentes de vírus.
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Entretanto, eles acreditam que essas mutações podem ser úteis para rastrear o histórico de transmissão e entender o padrão histórico da disseminação global. Os pesquisadores escoceses também esperam que mais mutações entre o vírus continuem se acumulando à medida que a pandemia continua. Mas espera-se que a maioria delas não altere de forma significativa a biologia do vírus.
Mutações são comuns em vírus
Mutações já são esperadas em vírus. Elas acontecem à medida que esse micro-organismos se replicam. Alguns vírus, como o influenza, sofrem muitas mutações rapidamente. É por isso que a vacina de gripe precisa ser atualizada anualmente. Mas o novo coronavírus parece ter um processo de mutação mais lento que o vírus da gripe.
Até o momento, estima-se que a Sars-CoV-2 tenha uma taxa inferior a 25 mutações por ano. O influenza tem 50. A maioria dessas mutações é neutra, ou seja não causam nenhuma alteração na forma como o vírus se comporta. Algumas são prejudiciais ao próprio vírus, o que impacta sua capacidade de sobrevivência, e outras são benéficas para o próprio vírus.
No momento, não se sabe em qual dessas categorias está a mutação D614G. Com todo o empenho da ciência em desvendar os mistérios do novo coronavírus, provavelmente informações mais precisas sobre essa questão estarão disponíveis em breve. Por ora, isso não motivo para preocupação, dizem especialistas.
Fonte: Veja