O policial-pastor já anunciou a principal novidade para o Carnaval de Salvador, caso seja eleito: uma festa evangélica batizada de Cristoval. Em Natal, o outrora sisudo empresário lançou sua candidatura empunhando uma palmatória de meio metro de comprimento e prometeu dar uma surra na corrupção.
Na eleição municipal que sucede a ascensão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), os candidatos da direita conservadora colocaram o time em campo e vão disputar as prefeituras das principais capitais do país.
Para chegar ao comando das prefeituras, apresentaram para a eleição nomes de policiais militares, delegados, empresários e pastores.
A tropa da segurança pública é a maior. Levantamento da Folha aponta que pelo menos 43 policiais e dois oficiais das Forças Armadas disputarão o cargo de prefeito ou vice nas 26 capitais de estados. Desses, apenas quatro são de partidos de esquerda e fazem oposição a Bolsonaro.
Pelo menos cinco chapas nas capitais serão formadas apenas por profissionais da segurança nos postos de candidatos a prefeito e vice. Em Aracaju, por exemplo, a delegada Geolize Telles (DEM) escolheu o coronel da Polícia Militar Péricles de Menezes para ser companheiro de chapa.
O presidente Jair Bolsonaro informou que não vai participar das campanhas no primeiro turno das eleições municipais, mas sinalizou apoio a candidatos em duas capitais: São Paulo e Manaus.
Na capital paulista, pelo menos seis candidatos disputam o voto dos eleitores mais à direita. Mas é o deputado federal Celso Russomanno (Republicanos) quem recebeu um aceno do presidente —com 29%, ele lidera a corrida municipal, segundo pesquisa Datafolha da semana passada.
Sobre Manaus, Bolsonaro disse aprovar Coronel Menezes (Patriota) em uma conversa informal com apoiadores.
O apoio foi comemorado pelo candidato, que é pouco conhecido e pretende crescer associando seu nome ao do presidente. “Sou o único candidato à prefeitura de Manaus que tem o DNA do Bolsonaro porque temos amizade desde quando fui cadete da Aman [Academia Militar das Agulhas Negras]. Seu apoio à minha candidatura é algo líquido, certo e inquestionável”, disse Coronel Menezes à Folha.
Mesmo com a sinalização, o apoio do presidente é disputado por outros candidatos, caso de Capitão Alberto Neto (Republicanos), que é deputado federal e vice-líder do governo na Câmara.
Nas demais capitais, os principais candidatos da direita conservadora batalham pelo apoio de Bolsonaro, de pessoas próximas a ele ou pelo menos buscam se mostrar afinados com as ideias bolsonaristas.
É o que tem feito o prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos), que tenta a reeleição e se aproximou do presidente. Na mesma disputa, o deputado federal Luiz Lima (PSL) tenta herdar o espólio do bolsonarismo na capital fluminense.
Em Fortaleza, dois candidatos disputam o voto conservador: Capitão Wagner (Pros) e Heitor Freire (PSL).
Deputado federal mais bem votado do Ceará em 2018, o policial militar Capitão Wagner concorre à prefeitura pela segunda vez como principal nome de oposição ao grupo do governador Camilo Santana (PT) e dos irmãos Ciro e Cid Gomes (PDT).
Com ascensão meteórica após liderar o motim da PM em 2011, Wagner tem a pauta da segurança pública como prioritária, mas não faz o estilo truculento. Na disputa deste ano, atraiu oito partidos, entre eles o Podemos e o Republicanos.
Questionado sobre um possível apoio de Bolsonaro em Fortaleza, Capitão Wagner diz que o presidente já declarou que não terá candidatos. “Mas os dois deputados mais ligados a ele aqui no Ceará estão comigo”, diz.
O deputado Heitor Freire, que também disputa a Prefeitura de Fortaleza, diz que aposta no voto conservador: “No passado, as pessoas tinham vergonha de dizer que eram de direita. Mas isso mudou”.
Com os entreveros entre Bolsonaro e o PSL, Freire diz que não deve ligar sua imagem à do presidente em sua campanha: “Apoio Bolsonaro, mas não vou usar o nome dele”.
No Recife, por outro lado, a disputa para ser “o candidato de Bolsonaro” é acirrada. Dentre as cinco candidaturas que miram o eleitorado mais conservador há uma delegada da Polícia Civil e um tenente-coronel da Polícia Militar.
A delegada Patrícia Domingos (Podemos), que ganhou visibilidade ao comandar a Delegacia de Crimes contra a Administração e Serviços Público, concorre a um cargo eletivo pela primeira vez.
Já o deputado Alberto Feitosa (PSC), que já foi secretário de Turismo na gestão do governador Eduardo Campos (PSB) e secretário de Saneamento do prefeito Geraldo Julio (PSB), virou nestas eleições Coronel Feitosa.
“Muitas pessoas já me chamavam de coronel nas áreas da periferia. Neste momento, apresentar sua origem na polícia tem um peso. O eleitorado se identifica mais facilmente”, justifica.
Advogados, médicos e empresários também compõem o rol dos candidatos da direita conservadora.
Presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte até junho deste ano, Marcelo Souza e Silva (Patriota) ganhou notoriedade ao polarizar com o prefeito Alexandre Kalil (PSD) ao defender a flexibilização da abertura do comércio em meio à pandemia da Covid-19, em posicionamento alinhado ao de Bolsonaro.
Também disputa o espólio bolsonarista na capital mineira o deputado estadual Bruno Engler (PRTB), coordenador do Movimento Direita Minas. Em entrevista à rádio Jovem Pan em abril deste ano, Bolsonaro afirmou que o nome de Engler o agrada, mas evitou cravar seu apoio.
Em Natal, o empresário Afrânio Miranda (Podemos), que era presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Rio Grande do Norte, vai buscar o voto conservador com um discurso focado no combate à corrupção.
Terá pela frente o prefeito Álvaro Dias (PSDB), que disputa a reeleição com o apoio do ministro Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional). Outra candidatura conservadora é a da Pastora Jayde (DC).
Assim como Natal, Macapá e Salvador terão pastores na disputa. Na capital baiana, o Pastor Sargento Isidório (Avante), que também é policial, concorre à prefeitura pela segunda vez. Uma de suas propostas é criar uma festa evangélica na cidade durante o Carnaval.
Em Macapá, o Pastor Guaracy Júnior é o candidato do PSL e deve brigar pelo voto bolsonarista com Cirilo Fernandes (PRTB) e Patrícia Ferraz (Podemos).
Cientista político e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, Túlio Velho Barreto diz que é natural que os partidos identificados com o eleitorado mais conservador procurem surfar na onda que se formou em 2018.
Ele diz que, quando há uma mudança significativa de direção no plano federal, cria-se um movimento. “Quando o PT chegou ao poder, por exemplo, o que se viu foi a construção de candidaturas mais ligadas ao mundo do trabalho, dos sindicatos, das lideranças populares”, analisa.
Ele lembra que, para formar uma candidatura competitiva, não basta apenas ser aliado ao governo federal do ponto de vista ideológico: “Há outros fatores também importantes, como a estrutura do partido no município, o momento em que a cidade está vivendo e a própria característica pessoal do candidato”.
Folhapress