O governo Lula (PT) tentará mais uma vez nesta quarta-feira (31) aprovar a MP (medida provisória) que trata da restruturação da Esplanada dos Ministérios sob risco de ela ser derrubada diante da pressão de parlamentares por mudanças na relação da gestão petista com o Congresso.
A MP seria analisada nesta terça-feira (30), mas acabou adiada em um revés aos planos do Palácio do Planalto, que tem até a noite de quinta-feira (1º) para aprovar a proposta no plenário da Câmara e depois no do Senado.
O movimento contra a votação da MP tem apoio de líderes do centrão, mas também inclui integrantes de partidos próximos a Lula, como a Solidariedade. A temperatura política, no entanto, indica que Lula e articuladores do Planalto precisarão de forte reação para evitar a maior derrota do governo até agora.
Nessa MP, o Congresso desfigurou uma série de atribuições ligadas especialmente aos temas ambiental e indígena. Membros do governo, porém, afirmam que já poderá ser considerada uma “vitória” se o texto aprovado na Câmara for igual ao apreciado na comissão mista.
Entenda o que explica esse quadro de revés ao governo federal:
1) Qual o motivo do adiamento da votação? Há uma série deles. A decisão pelo adiamento foi tomada em uma reunião entre Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, e líderes partidários, incluindo o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), no final da noite de terça.
Na ocasião, Guimarães foi cobrado, segundo relatos, pela demora na liberação de cargos e emendas e pela falta interlocução dos deputados com ministros do governo e o presidente da República.
Apontam também que há excesso de espaços para o próprio PT e siglas que não necessariamente entregam os votos no Congresso, como a União Brasil.
2) Atritos do Congresso com ministros de Lula contribuem para essa clima? Sim. Parlamentares reclamaram muito da postura de Rui Costa (Casa Civil) e Flávio Dino (Justiça).
Ao primeiro é atribuída a culpa pela demora na liberação de emendas e cargos, além de falta de traquejo político. Deputados reclamam que ele não os recebe e tenta, sem articular, adotar medidas que driblam o Congresso, como o decreto do marco do saneamento.
Já Dino foi alvo de reclamações por viajar o país e não comunicar os parlamentares para que eles possam fazer política nos estados.
Marina Silva (Meio Ambiente) e Sônia Guajajara (Povos Indígenas), cujos ministérios foram os principais atingidos pela versão dada pelo Congresso à medida provisória, são criticadas por travarem a nomeação de cargos.
Segundo relatos, Marina não permite indicação de parlamentares nos estados para o Ibama e Guajajara, por sua vez, não aceita indicações políticas para postos regionais da Funai.
3) Lula tem uma base suficiente para aprovação de projetos na Câmara e no Senado? Não. Lula tem uma base de esquerda que se resume a apenas cerca de um quarto das cadeiras do Congresso. Por isso, distribuiu ministérios a partidos de centro e de direita e busca apoio no varejo, com a partilha de emendas e cargos. Nesse ponto, há pressão de Arthur Lira, presidente da Câmara, e seus aliados para manter a gerência desses repasses, como forma de ter melhores resultados na obtenção de apoio.
4) A rebelião é comandada apenas pelo bloco do chamado centrão, formado por partidos de centro e de direita? Não. O movimento contra a votação da MP tem apoio sim de líderes do centrão, mas também inclui integrantes de partidos próximos a Lula, como a Solidariedade. A temperatura política, no entanto, indica que Lula e articuladores do Planalto precisarão de forte reação para evitar a maior derrota do governo até agora.
5) Os entraves para a votação da MP estão ligadas apenas à relação entre Lula e o Congresso? Não. Por trás dos entraves também há uma disputa entre o presidente da Câmara, Arthur Lira, e o senador Renan Calheiros (MDB) que deve se manter independentemente do desfecho da MP, na avaliação de governistas e membros do Palácio do Planalto.
Além da insatisfação de parlamentares, integrantes do governo dizem que Lira mandou recados pedindo ao Palácio do Planalto a demissão do ministro Renan Filho (Transportes). O presidente da Câmara se irritou com publicações nas redes sociais de Renan, pai do ministro e aliado de Lula.
No Twitter, o senador chamou Lira de caloteiro, o acusou de desviar dinheiro público e também de ter batido na ex-mulher Julyenne Lins.
O presidente da Câmara mandou recado ao Planalto de que considerava inadmissíveis as declarações do senador da base de Lula e que o governo estava sendo leniente ao manter o filho dele, Renan Filho, à frente do Ministério dos Transportes.
Aliados de Renan, porém, dizem que o governo faz uma avaliação equivocada sobre a influência de uma disputa local, em Alagoas, na política nacional. Uma parte de líderes governistas também minimiza o efeito do embate entre o presidente da Câmara e o senador.
À noite, Lira foi às redes sociais negar que tenha “pedido a cabeça” do ministro. “É falsa e descabida a informação que pedi ‘a cabeça de ministro’, e muito menos em troca de aprovação de qualquer proposta do governo. Tenho agido sempre com respeito aos Poderes”, escreveu.
Folha de S. Paulo