Empresas querem que medidas provisórias na crise virem permanentes

Associações empresariais de vários setores estão pressionando o governo federal a ampliar as primeiras medidas tomadas para ajudar empresas a atravessar a fase mais aguda da crise do coronavírus, num momento em que os efeitos econômicos da epidemia se tornam mais evidentes.

Elas querem aumentar o alcance das medidas emergenciais, esticar prazos para pagamento de impostos e reabrir discussões iniciadas antes da epidemia, na tentativa de convencer o governo de que o atendimento de suas reivindicações permitirá acelerar a recuperação da economia depois que o pior passar.

O Ministério da Economia afirma que recebeu mais de 1.300 pedidos de vários setores, desde o início da crise, em março. Descontados os pleitos redundantes, ele calcula que tenha atendido totalmente 30% e parcialmente outros 20%. Os demais foram arquivados, ou ainda estão sendo analisados.

No início de abril, o governo adiou para o segundo semestre o prazo para recolhimento de dois tributos federais, PIS e Cofins, e das contribuições previdenciárias de abril e maio. A medida deu fôlego para o caixa das empresas, mas ficou muito aquém dos pedidos feitos pelas associações.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) havia pedido a prorrogação do vencimento de todos os tributos federais por 90 dias. Um grupo de entidades representativas do varejo pediu a suspensão do recolhimento dos tributos por 180 dias, e seu pagamento em parcelas sem correção no ano que vem.

“A evolução da crise está mostrando que não vai adiantar só jogar para frente, porque muitas empresas não vão conseguir pagar”, diz Glauco Humai, presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce). “O governo vai ter que entrar com dinheiro a fundo perdido em algum momento”.

Para micro e pequenas empresas enquadradas no Simples, foi prorrogado por 90 dias o recolhimento da parte da União nos tributos. Valores cobrados em abril, maio e junho deverão ser pagos pelas empresas no fim do segundo semestre, em três parcelas a partir de outubro.

As principais associações empresariais também pediram a suspensão dos pagamentos devidos pelas companhias que aderiram aos vários programas de refinanciamento de dívidas tributárias, os Refis. O governo não atendeu esses pleitos, mas as entidades continuam insistindo na reivindicação.

A Procuradoria-Geral da Fazenda foi autorizada a suspender por 90 dias procedimentos de rescisão dos parcelamentos de devedores que não conseguirem pagar suas parcelas agora, mas a medida não oferece alívio aos inadimplentes depois desse período, considerado insuficiente para muitas empresas.

“O risco é que uma momentânea falta de caixa neste momento faça voltar um problema que a empresa já tinha equacionado quando entrou no programa de parcelamento, antes da crise”, afirma Eduardo Lucano, presidente-executivo da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca).

A entidade também pediu ao Ministério da Economia que permita às empresas deduzir dos seus impostos o valor das doações que fizerem para auxiliar o combate ao coronavírus. Pelas regras atuais, doações a entidades consideradas de utilidade pública são dedutíveis, mas não doações feitas a governos.

De acordo com levantamento feito pelo Ministério da Economia, 28% dos pedidos recebidos pelo governo são de alívio na área tributária, 22% são propostas de mudança de normas e obrigações das empresas, 18% são pedidos de facilidades de crédito e 13% são mudanças na área trabalhista.

O governo ampliou recursos disponíveis no sistema financeiro para crédito, criou linhas emergenciais nos bancos públicos e mecanismos para compensar perdas que trabalhadores sofrerão, mas tem hesitado em ampliar medidas por causa do impacto do aumento de gastos para as contas públicas.

A Associação Brasileira da In­fraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) tem cobrado providências para blindar receitas das concessionárias de estradas e outros serviços contra ações de governos locais e pede relaxamento de obrigações contratuais que elas não conseguirão cumprir se a paralisia da economia for prolongada.

“Há dezenas de projetos em andamento no Congresso que propõem redução de pedágios e outras medidas que atingem as receitas das concessionárias sem oferecer compensação, amplificando o impacto da retração da economia sobre as empresas”, diz o presidente-executivo da Abdib, Venilton Tadini.

O Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon), que representa grandes empreiteiras, propôs ao governo um programa de retomada de obras públicas custeado por um esquema financeiro garantido por multas devidas pelas empresas atingidas pelas investigações da Operação Lava Jato.

Como os acordos de leniência que elas firmaram ao decidir cooperar com a Justiça preveem pagamentos ao longo de mais de vinte anos, a ideia seria usar os créditos futuros para levantar financiamento no mercado e destinar o dinheiro a obras que fazem parte da carteira das empreiteiras e estão paradas.

O plano foi formulado pelas empresas antes da crise, mas a conversa com o governo não andou. Com a chegada do coronavírus, as empreiteiras resolveram retomar o assunto. O presidente do Sinicon, Cláudio Medeiros, ligado à Odebrecht, calcula que o fundo poderia levantar R$ 7 bilhões para investimentos.

O Ministério da Infraestrutura tem acenado às empreiteiras com um pacote de R$ 30 bilhões para realização de obras em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos depois que a fase mais aguda da crise passar. Os projetos estão prontos para começar, mas dependem da liberação de recursos do Orçamento.

A apresentação dessas iniciativas é também uma tentativa do governo de conter as pressões por novas medidas de alívio agora. “Estamos discutindo as urgências do presente, mas também precisamos pensar no momento da retomada”, diz o secretário de Desenvolvimento da Infraestrutura do ministério, Diogo Mac Cord.

Folhapress