Militantes cumprem ‘missões diárias’ e se infiltram em grupos de adversários no 2º turno

A reta final do segundo turno deu novo impulso nas redes sociais às militâncias de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), que traçam estratégias de última hora para aumentar a rejeição dos adversários e conquistar o voto de indecisos.

Dos dois lados, porta-vozes com expertise digital convocam eleitores para cumprirem “missões diárias”, em ordens que são dadas por canais de Telegram, que viraram QGs digitais.

A esquerda, antes refém da hegemonia bolsonarista nas redes sociais, também passou a se infiltrar em grupos de conversa, o que tem exigindo cautela de membros pró-governo.

Pablo Marçal, coach e ex-presidenciável do Pros, participou de uma live com Bolsonaro na quinta-feira (13), quando fez um apelo para que militância “suspenda a reputação para defender a nação” pela reeleição do presidente. A ideia é que apoiadores ajam como um batalhão difusor de conteúdo em aplicativos de conversa e nas redes sociais nos dias que antecedem o segundo turno.

O deputado federal André Janones (Avante-MG), um dos cabos eleitorais mais estridentes de Lula na internet, fez chamado semelhante um dia depois. “Na terça-feira, vamos ter um encontro gigante de comunicadores. Já temos 8 mil influencers confirmados. Bora, tropa”, escreveu no Telegram. Ao final de quase toda mensagem, ele diz: “É guerra!”.

O “Influenciadores PRO Bolsonaro”, de Marçal, logo reuniu 114 mil pessoas —em parte porque o aplicativo é um reduto bolsonarista. O canal de Janones tem cerca de 18 mil –em parte porque o próprio parlamentar sempre foi adepto ao Facebook e, mais recentemente, ao Twitter.

“Você foi chamado para influenciar e não para ser influenciado. Você foi chamado para liderar uma geração”, diz Tiago Rocha, executivo de Marçal, em uma live de YouTube onde ele passa os comandos do dia.

Tratam-se de sete missões, que incluem trocar a foto de perfil de todas as redes sociais (eles distribuem um modelo por QR-Code com a bandeira do Brasil), criar um grupo de WhatsApp, montar um QG em casa com materiais de propaganda da campanha e participar do “arrastão digital” contra os “20 principais meios de comunicação do Brasil que ficam denegrindo a imagem do presidente Bolsonaro”.

Janones atua conforme o conteúdo polêmico do dia, dando instruções de marketing como “o assunto orçamento secreto, por exemplo, não tem capilaridade no ‘Face’. É assunto para Twitter e, no máximo, Instagram” ou “enviem nos grupos de família, amigos, futebol, não percam tempo enviando a grupos de política”.

“Todos que tiverem Face, entrem no último post do Bolsonaro e peçam explicações para ele sobre a fala em que ele diz ter pintado um clima entre ele e uma criança de 14 anos. Ele está fingindo que não é como ele. Mas terá que se explicar. Vamos cobrar. Muito”, disparou no sábado (15) à noite. No dia anterior, o presidente havia usado a expressão “pintou um clima” para se referir a adolescentes venezuelanas.

No domingo pela manhã (16), Janones compartilhou em todos os seus perfis um vídeo em que Bolsonaro homenageia o ex-ditador do Paraguai Alfredo Stroessner, acusado de abuso sexual de menores, e diz que um dossiê sobre a relação do atual presidente com criminosos acusados de pedofilia será encaminhado à Justiça.

A campanha de Bolsonaro foi ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no sábado pedir que todos os perfis de Janones sejam derrubados até o fim da eleição por serem uma “fábrica de fake news”.

Já no WhatsApp, a campanha oficial do PT tem 186 grupos de conversa, quase todos com o limite máximo de participadores, de 256, onde propagandas pró-Lula e anti-Bolsonaro são distribuídas diariamente à militância.

Muito diferente dos grupos de WhatsApp bolsonaristas, que se multiplicam desde antes da eleição de 2018 sem vínculo explícito com a campanha oficial, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) passou a criticar a coordenação adversária. Em vídeo, a chamou os grupos do “Lulaverso”, nome da campanha de Lula nas redes, de “milícia digital”, termo que nasceu pela associação da direita à divulgação de fake news.

Os grupos do petista contam com adesão voluntária das pessoas pelo site da campanha. No Telegram, onde a presença da esquerda é muito inferior, militantes passaram a se infiltrar em grupos “patriotas” ora para disparar spam pró-Lula, ora para confundir o debate.

De acordo com monitoramento do Observador Folha/Quaest, as menções à palavra “infiltrados” começaram a crescer em 4 de outubro, quando vários eleitores de Lula entraram em grupos relevantes do bolsonarismo para divulgar vídeos do atual presidente em uma loja maçônica. Parte da militância entendeu que se tratava de uma estratégia e passou a denunciá-los a administradores dos grupos.

Os infiltrados costumam ter ilustrações nos avatares e escrever com a grafia correta, o que destoa da comunicação rápida, marcada por falta de pontuação e pelo uso excessivo de maiúscula de grande parte dos integrantes.

“Pessoal, muito cuidado com os ADMs dos grupos que dizem ser de direita. Tem muitos infiltrados. Fiquem atentos a todos os seus atos e opiniões”, “@admin petista infiltrado”, “FORA INFILTRADO! @ADM!” e “Se os ADM não expulsarem os petralhas infiltrados, sairei do grupo” são exemplos de mensagens. ADM é a sigla para administradores, quem têm o poder de vetar participantes nos grupos de Telegram.

“Atenção! Todos os grupos de patriotas conservadores bolsonaristas do Telegram estão contaminados por infiltrados petistas que se dizem bolsonaristas. O objetivo deles é se passar por bolsonarista arrependido para te induzir, persuadir, manipular com argumentos chulos, narrativas chulas, fake, a anular o voto, votar em branco ou até mesmo no ex-presidiário”, diz uma mensagem encaminhada a diversos grupos.

Segundo a Quaest, o alerta apareceu mais de 500 vezes no Telegram durante a campanha do segundo turno.

Paula Soprana/Folhapress