Não tenho como saber o que acontece nos ministérios, diz Bolsonaro sobre caso Covaxin

Ao comentar com apoiadores nesta segunda-feira (28) a denúncia de irregularidades na compra da vacina Covaxin, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse que não tem como saber o que acontece nos ministérios de seu governo.

Em entrevista à Folha, o deputado Luis Miranda (DEM-DF) afirmou que o esquema de corrupção do Ministério da Saúde pode ser “muito maior” do que o caso da vacina Covaxin, investigado pela CPI da Covid do Senado.

“Ele [o deputado Luis Miranda (DEM-DF)] que apresentou [informações sobre a compra da vacina], eu nem sabia como é que estavam as tratativas da Covaxin porque são 22 ministérios. Só o ministério do Rogério Marinho [desenvolvimento Regional] tem mais de 20 mil obras. [O Ministério da Infraestrutura], do Tarcísio [de Freitas] não sei, deve ter algumas dezenas, centenas de obras. Não tenho como saber. O da Damares [Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos], o da Justiça, o da Educação. Não tenho como saber o que acontece nos ministérios, vou na confiança em cima de ministro, e nada fizemos de errado”, disse Bolsonaro.

O presidente reconheceu novamente ter recebido a visita de Luis Miranda, mas afirmou que “aqui vem tudo quanto é tipo de gente”. “Não posso falar ‘você é deputado, deixa eu ver tua ficha aí’. Eu ia receber pouca gente. Recebo todo mundo”, disse Bolsonaro.

O presidente também rebateu o entendimento de que o caso Covaxin trinca o discurso anticorrupção do governo, como a Folha mostrou na semana passada.

“Agora, os caras botam a narrativa ‘a vacina fissura o governo Bolsonaro no tocante à corrupção’”, queixou-se o presidente, que alegou que nenhuma vacina foi de fato comprada.

“Inventaram a corrupção virtual, né? Não recebemos uma dose, não pagamos um centavo”, disse Bolsonaro.

Um dos apoiadores referiu-se aos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), presidente da comissão, e ao deputado Renildo Calheiros (PC do B-PE), irmão do relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL) como “os três patetas”, e Bolsonaro reagiu.

“Não são patetas, são bastante espertos. Sabem o que querem. Querem o Brasil como era antigamente e viver na impunidade. Eles estão fazendo a coisa para eles bastante certas. Eles estão de parabéns para os objetivos deles”, afirmou.

O QUE ACONTECEU APÓS A REVELAÇÃO DO CASO PELA FOLHA
Reportagem aponta pressão atípica (18.jun)
Em depoimento mantido em sigilo pelo MPF (Ministério Público Federal) e obtido pela Folha, Luís Ricardo Fernandes Miranda, chefe da divisão de importação do Ministério da Saúde, afirmou ter sofrido pressão de forma atípica para tentar garantir a importação da vacina indiana Covaxin

‘É bem mais grave’ (22.jun)
Irmão do servidor do Ministério da Saúde, o deputado federal Luís Miranda (DEM-DF) disse à Folha que o caso é “bem mais grave” do que a pressão para fechar o contrato

Menção a Bolsonaro (23.jun)
Luis Miranda afirmou ter alertado o presidente sobre os indícios de irregularidade. “No dia 20 de março fui pessoalmente, com o servidor da Saúde que é meu irmão, e levamos toda a documentação para ele”

CPI aprova depoimentos (23.jun)
Os senadores da comissão aprovaram requerimento de convite para que o servidor Luís Ricardo Miranda preste depoimento. A oitiva será nesta sexta-feira (25) e o deputado Luis Miranda também será ouvido.
Os parlamentares também aprovaram requerimento de convocação (modelo no qual a presença é obrigatória) do tenente-coronel Alex Lial Marinho, que seria um dos autores da pressão em benefício da Covaxin. A CPI também decidiu pela quebra de sigilo bancário, fiscal, telefônico e telemático de Lial Marinho

Denúncia grave (23.jun)
Presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que as denúncias de pressão e a possibilidade de que o presidente Jair Bolsonaro tenha tido conhecimento da situação talvez seja a denúncia mais grave recebida até aqui pela comissão

Bolsonaro manda PF investigar servidor e deputado (23.jun)
O presidente mandou a Polícia Federal investigar o deputado Luis Miranda e o irmão dele, Luis Ricardo Fernandes Miranda. O ministro da Secretaria-Geral, Onyx Lorenzoni, e Elcio Franco, assessor especial da Casa Civil e ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde, foram escalados para fazer a defesa do presidente. Elcio é um dos 14 investigados pela CPI

Empresa diz que preço para Brasil segue tabela (23.jun)
A Precisa Medicamentos, representante no Brasil do laboratório indiano Bharat Biotech, afirmou que o preço de US$ 15 por dose da vacina oferecido ao governo segue tabela mundial e é o mesmo praticado com outros 13 países

Governistas dizem que Bolsonaro repassou suspeitas a Pazuello (24.jun)
Senadores governistas da CPI afirmaram que o presidente pediu que Pazuello verificasse as denúncias envolvendo a compra da Covaxin assim que teve contato com os indícios

‘Acusação é arma que sobra’ (24.jun)
Bolsonaro fustigou integrantes da CPI, repetiu que não há suspeitas de corrupção em seu governo e afirmou que a acusação sobre a vacina é a arma que sobra aos seus opositores. “Me acusam de quase tudo, até de comprar uma vacina que não chegou no Brasil. A acusação é a arma que sobra”, disse o presidente na cidade de Pau de Ferros, no Rio Grande do Norte

‘Foi o Ricardo Barros que o presidente falou’ (25.jun)
Em depoimento à CPI da Covid, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), que é irmão do servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, afirmou ter alertado Bolsonaro. “A senhora também sabe que foi o Ricardo Barros que o presidente falou”, disse o parlamentar à senadora Simone Tebet (MDB-MS). Segundo ele, Bolsonaro afirmou: “Vocês sabem quem é, né? Sabem que ali é foda. Se eu mexo nisso aí, você já viu a merda que vai dar, né? Isso é fulano. Vocês sabem que é fulano”.

Daniel Carvalho/Folhapress

Foto: Reuters