O cenário de completa tensão e incerteza que se anunciava na Venezuela por meses finalmente desaguou nas primeiras horas desta segunda-feira (29). Com os venezuelanos vidrados em seus celulares aguardando um anúncio, o órgão eleitoral afirmou que o ditador Nicolás Maduro foi reeleito para mais seis anos no poder. A oposição prontamente contestou e afirmou que houve fraude.
Segundo o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), o líder do regime teria obtido 51,2% votos, enquanto o opositor Edmundo González, à sombra da líder María Corina Machado, teria apoio de 44,2%. A participação teria sido de 59% no país em que votar não é obrigatório. Estariam apuradas 80% das urnas, mas os resultados já seriam irreversíveis.
Era início da madrugada em Caracas, e as ruas estavam completamente vazias. Não havia sons de protestos, sejam de celebração ou lástima.
As porcentagens oficiais indicam que Maduro teria recebido pouco mais de 5,1 milhão de votos, enquanto González, 4,4 milhões. Estavam inscritos para votar 21 milhões de eleitores em todo o país.
O anúncio do CNE foi seguido por quase uma hora de total silêncio e desânimo no local do comando de campanha da oposição. Distribuídos em cadeiras os apoiadores mais próximos da campanha bisbilhotavam diversas pesquisas de boca de urna (proibidas na lei eleitoral local) e diziam: foi “trampa”, uma referência à fraude em espanhol.
Até que González e María Corina discursaram. “Queremos dizer a todos os venezuelanos e ao mundo que a Venezuela tem um novo presidente eleito, e é Edmundo González Urrutia”, disse a ex-deputada liberal. “Ganhamos, e todo o mundo sabe. Ganhamos em todos os estados.”
María Corina afirmou que, de acordo com as contagens da oposição, González foi vitorioso com 70% dos votos. Os opositores teriam conhecimento de 40% das atas eleitorais, diz ela, uma vez que as demais não teriam sido transmitidas pelos centros de votação.
A oposição por sua vez afirma que algumas atas eleitorais não foram transmitidas ao CNE e que suas testemunhas eleitorais tampouco puderam recebê-las, como prevê a legislação eleitoral.
Ainda não se sabe de que maneiras a oposição irá levar adiante suas contestações. Esta foi ainda a primeira vez nos últimos 25 anos, desde que o militar Hugo Chávez (1954-2013) ascendeu ao poder, e notadamente desde que Maduro o substituiu no Palácio de Miraflores, há 11 anos, que a campanha opositora aparentava ter tamanha capilaridade.
Há enorme expectativa no país sobre qual será o cenário no amanhecer dessa segunda-feira. Nos últimos dias a convivência em Caracas era pacífica. No último dia 25, aniversário da capital, Maduro e González levaram milhares às ruas em seus respectivos atos de fim de campanha. Mas já era anunciado que, qualquer fosse o resultado divulgado, o temor de confrontos tomaria conta do país.
Ex-líder sindical e trabalhador do metrô de Caracas, Maduro foi chanceler de Chávez, época em que costurou suas relações com líderes regionais, ainda que em seu período no poder tenha construído o que Milos Alcalay, ex-embaixador venezuelano no Brasil e na ONU, descreva como “dialética da confrontação”, ao isolar-se diplomaticamente.
Durante sua mais de uma década no poder e após o ápice da entrada dos petrodólares no governo Chávez, que possibilitaram o alargamento da máquina pública e o despejo de programas sociais, Maduro liderou um país em derrocada econômica que no ápice da crise, 2018, chegou a registrar inflação anual de 130.000% segundo dados oficiais —segundo o FMI (Fundo Monetário Internacional), o número foi de 1.370.000%.
Mayara Paixão/Folhapress