Lembro que, quando era criança, há quase 40 anos, eu ouvia os adultos discutirem e darem como certa a possibilidade de uma reforma tributária. O tempo passou e todas as reformas que surgiram desde então terminaram com a criação de uma nova contribuição federal e com o aumento dessa estrutura, enquanto estados e municípios, que estão na ponta, seguiram em dificuldade.Desde o ano passado, o debate em torno de uma reforma tributária voltou à tona e, em 2020, ganhou ainda mais força. Agora, diferente das discussões anteriores, chegamos a um estágio de sensibilização em que a criação de uma nova contribuição, como se fala em uma CPMF, não tem aprovação do Congresso Nacional. Não se quer criar novos impostos, mas fazer o ordenamento do sistema, buscando a sua eficácia.E é justamente neste sentido que as discussões estão avançando no Parlamento. Na Câmara dos Deputados, eu fui relator da PEC 45, uma das propostas de reforma tributária que tramitam no Congresso. É uma reforma simplificadora, que transforma cinco impostos (PIS, Cofins, Pasep, ICMS e ISS) em apenas um, o IBS (Imposto Sobre Bens e Serviços). Por enquanto, não é diminuição de impostos, que é algo almejado por nós, mas é uma medida essencial para garantir mais fluidez no nosso sistema de arrecadação. No entanto, para chegar nesse ponto, precisamos antes simplificar essa estrutura. O Brasil hoje é um dos últimos países no ranking mundial na eficácia de arrecadação de impostos devido à sua complexidade e subjetividade. São mais de 500 mil portarias e regramentos sobre as matérias tributárias, o que torna esse sistema complexo e gera muita confusão em sua interpretação.Com isso, vamos desonerar toda a cadeia produtiva, diferente da lógica atual. Por exemplo, um estado produtor como São Paulo produz um item, manda para a Bahia, mas já destaca lá 6% de ICMS, que já fica na fonte. Isso faz com que o recurso fique preso nas teias de arrecadação e, portanto, esse dinheiro não flui, não serve para crédito.Hoje, o comerciante vende o produto para receber com 90 dias, mas ele já tem que pagar o ICMS com 21 dias. Então, se conseguirmos passar essa cobrança para o final da etapa do consumo, que é quando o cidadão compra efetivamente o produto, conseguimos ter um ingresso de capital muito grande que ativa nossa economia. Essa é a ideia principal da reforma.Essa simplificação será fundamental para a retomada do nosso crescimento econômico no período pós-pandemia. Hoje vivemos as mazelas de saúde pública, mas no próximo ano viveremos uma grande recessão da nossa economia, então, nós vamos precisar de ferramentas para conseguir buscar um equilíbrio e minimizar os impactos dessa crise, e a reforma tributária, sem dúvidas, será uma das principais.Além disso, essa matéria tem potencial para construir um novo pacto civilizatório para os brasileiros. Hoje, quem mais paga imposto é exatamente o mais pobre. Então, quando o cidadão chegar no mercado, pegar determinado produto e pagar o imposto em cima, ali na hora, ela vai pensar: ‘poxa, eu estou pagando muito imposto para o governo’. Isso começa a dar pertencimento à população, que passa a valorizar mais o patrimônio público. Hoje, o cidadão não consegue enxergar quanto ele paga de imposto. Precisamos agregar mais transparência a este processo todo, este é um recurso fundamental para despertar a credibilidade da população na estrutura do estado brasileiro.Enfim, o debate tem começado a avançar nas últimas semanas e o próprio governo deve mandar, em breve, a sua proposta de reforma para o Congresso, que já tem, além da PEC 45, a PEC 110, do Senado. É chegado o momento de aprofundar o diálogo e buscar a sensibilização necessária para a aprovação dessa matéria tão importante.Se não existir realmente uma sintonia entre governo, Senado e Câmara, não vamos conseguir aprovar essa reforma ainda no segundo semestre, o que seria essencial para ajudar o Brasil a superar as mazelas dessa pandemia. Agora, mais do que nunca, precisaremos de diálogo, harmonia e serenidade nas discussões para aprovarmos essa matéria, sob pena de agravarmos ainda mais os impactos que temos sofrido com a recessão. |