Ana Cristina Santos Silva, de 52 anos, agora tem a segurança de que os dois filhos podem dormir tranquilos, longe da possibilidade de que algo ruim lhes aconteça. Há três meses, a família vive fora das ruas de Salvador, em uma casa assegurada pelo Moradia Assistida, um projeto-piloto de intervenção social desenvolvida pela Secretaria Municipal de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esporte e Lazer (Sempre), que já beneficiou 65 pessoas em situação de rua, vulnerabilidade e risco social.
O principal objetivo do projeto é atender pessoas que vivem em situação de rua há mais de cinco anos, fazem uso abusivo de drogas e não se adaptam aos modelos tradicionais de acolhimento provisório. O Moradia Assistida será expandido e, em breve, 80 novas casas serão entregues, com capacidade para atender 400 pessoas.
Autoestima – Ana Cristina, que passou anos morando no centro de Salvador, não apenas saiu das ruas, mas também se distanciou do mundo das drogas. Se antes se via como alguém sem valor, como ela mesma descreve, agora se enxerga como uma mulher guerreira, com a chance de seguir um novo caminho ao lado dos filhos.
“Naquela época, eu não sabia o que eu era. Eu me sentia uma pessoa suja na minha vida, entende? Depois que entrei nessa casa, me sinto uma pessoa maravilhosa. Hoje, eu tenho um lugar para botar a cabeça dos meus filhos, botar minha cabeça, sair despreocupada. Eu posso dizer a você, posso me chamar de mulher, eu sou uma mulher”, comenta.
Segurança – Emily Silva, de 21 anos, filha de Ana Cristina, destaca que, no passado, viver na rua era uma experiência traumática, cheia de insegurança e medo, especialmente por estar cercada de violência e drogas. Com a chegada da moradia, as duas, inclusive, estreitaram os laços afetivos.
“Nossa vida melhorou bastante. Muitos anos atrás, não tivemos a oportunidade atual de ter um lar, de ter um lugar onde minha mãe pudesse criar os filhos dela. Era constrangedor viver na rua, em um lugar aberto, cercadas por pessoas com as quais a gente não sabia lidar. Eram pessoas envolvidas com drogas e violentas. Como menina, eu me sentia muito insegura, com medo de ser abusada. E hoje, graças a Deus e ao projeto, temos a nossa casa. Estou feliz”, disse a jovem.
Dignidade – De acordo com Luciene Santana, coordenadora do Moradia Assistida, o projeto piloto é uma iniciativa que busca garantir o direito básico à moradia para pessoas em situação de rua, ajudando-as a se reintegrarem na sociedade, como Ana Cristina. Ela destaca ainda que o objetivo é proporcionar dignidade e pertencimento a essas pessoas, garantindo um direito fundamental.
“O projeto trabalha na perspectiva de garantir direitos, sendo a moradia um princípio básico. Para nós, que somos agentes dessa política pública, nosso foco é assegurar esse direito. Oferecer a qualquer cidadão a oportunidade de se sentir pertencente à sociedade é algo muito gratificante”, diz a coordenadora.
Pioneirismo – Conforme Ravena de Melo, coordenadora de Ação e Prevenção de Políticas sobre Drogas, o Moradia Assistida está sendo estudado para se tornar uma política pública nacional. Em setembro do ano passado, representantes do Governo Federal estiveram na capital baiana para conhecer o funcionamento do projeto.
“Recebemos a visita de quatro ministérios que vieram conhecer o projeto-piloto de Salvador, que tem inspirado a criação de uma política nacional. O Ministério da Cidadania, que está à frente do Moradia Cidadã, veio se inspirar no Moradia Assistida. Acho importante destacar que estamos sendo pioneiros no lançamento dessa ação no Brasil”, comenta.
Acolhimento – O titular da Sempre, Junior Magalhães, destaca que o programa surgiu porque a situação de rua é complexa e requer uma abordagem multidisciplinar. “Os técnicos do programa identificaram a necessidade de alternativas para aqueles que não se adaptavam às formas tradicionais de acolhimento institucional, e daí nasceu o Moradia Assistida”, pontua.
Fotos: Jefferson Peixoto/ Secom PMS