As datas exatas das eleições municipais são tão desconhecidas no momento quanto a cura da Covid-19, mas o dia em que os pré-candidatos a prefeito e vereador podem lançar vaquinhas virtuais para levantar recursos está mantido pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Pontapé da campanha eleitoral, a arrecadação de doações pela internet começa na próxima sexta-feira (15) ainda cercada de dúvidas. A autorização para pedir dinheiro antes mesmo de obter o registro de candidatura nem é novidade, mas a pandemia do coronavírus mudou tudo.
No pleito de 2018, primeiro em que o TSE habilitou plataformas para oferecer o serviço a partidos e postulantes, as vaquinhas também foram abertas em maio. Candidatos em todo o país captaram com elas, no total, R$ 20 milhões.
O valor é considerado pequeno se comparado, por exemplo, ao R$ 1,7 bilhão do fundo eleitoral, o chamado fundão, repassado aos partidos pelo tribunal na ocasião. Recursos do próprio bolso e do fundo partidário também foram usados no custeio.
Desta vez, além da incerteza sobre a data do pleito (o adiamento para novembro ou dezembro é discutido no Congresso e avaliado pelo TSE), outras questões rondam os comitês.
Existe clima para pedir dinheiro para campanha política no meio de uma calamidade? Os brasileiros doarão mesmo com a crise econômica que se avizinha? Passar o chapéu enquanto muitas famílias ainda vivem o luto pode pegar mal e afugentar potenciais eleitores?
Partidos e pré-candidatos consultados pela Folha ainda fazem cálculos sobre os riscos e falam em adotar cautela antes de abrir a coleta. No lado das empresas que buscam o credenciamento do TSE para vender o serviço (e tirar lucro com as transações), o discurso é de otimismo.
Uma das faces da discussão está relacionada ao debate ético sobre o uso do fundão que se espalhou quase na velocidade do vírus. Eleitores passaram a defender a destinação da verba para a saúde, criando um constrangimento sobre concorrentes que vierem a utilizar o recurso na eleição.
Enquanto o Congresso analisa propostas para direcionar ao menos parte do fundo para a emergência sanitária, pré-candidatos país afora têm se antecipado e anunciado, isoladamente, que dispensarão a ajuda pública. O Partido Novo já recusava o repasse, e o PRTB anunciou que fará o mesmo.
Nesses casos, a grande aposta passará a ser no recebimento de contribuições de pessoas físicas (as de empresas já estão proibidas desde 2015).
Pré-candidata a vereadora na capital paulista pelo PDT, a novata Barbara Panseri quer iniciar logo sua vaquinha, mas admite o risco de ser mal interpretada. “Tem que tomar cuidado na forma como a comunicação é feita. Pedir dinheiro neste momento pode ser alvo de contestação”, afirma.
Barbara, que é especialista em gestão pública e estima precisar de ao menos R$ 100 mil para a candidatura, diz que “toda campanha carece de alguma fonte de financiamento e a crise atual mostra a necessidade de dar uma resposta política aos problemas da sociedade”.
A vantagem de criar um crowdfunding agora, na opinião dela, é poder dar visibilidade a seu embrionário projeto político e começar a aglutinar apoiadores desde já. Boca a boca, afinal, não custa nada.
“A tendência é que as campanhas, que normalmente já são mais baratas no âmbito municipal, busquem ser ainda mais econômicas neste ano”, diz Bernardo Cubric, da Democratize, uma das plataformas que já obtiveram a permissão do TSE para oferecer a funcionalidade.
Pelas regras, as empresas retêm o dinheiro até que o candidato tenha conta oficial de campanha, o que antes estava previsto para ocorrer em agosto. Só então o montante começa a ser transferido. As companhias cobram uma taxa de adesão única, além de percentual de 5% a 10% por doação.
“Apesar de todas as incertezas, as campanhas estão pensando cada vez mais no digital. Temos registrado uma busca alta, muito maior do que em 2016 ou 2018”, afirma Thiago Rondon, da Voto Legal, uma das pioneiras no setor, com mais de 500 campanhas no histórico.
A crença de que o ambiente digital prevalecerá sobre o corpo a corpo na rua tem a ver com o próprio contexto em que deverá se dar a disputa. Uma das razões para o possível adiamento é justamente evitar aglomerações de pessoas, situação favorável para a transmissão da doença.
Folha de S.Paulo